Depois de admitir que seu "instinto" era cair fora, cedendo à pressão generais, o presidente Donald Trump anunciou ontem à noite que vai intensificar a participação dos Estados Unidos na Guerra do Afeganistão, a mais longa da história americana, e aumentar a pressão sobre o Paquistão. Mas não deu detalhes importantes como número de soldados.
"Meu instinto original era cair fora", declarou Trump em pronunciamento diante da tropa perfilada em Forte Myers, no estado da Virgínia. Antes de chegar à Casa Branca, ele descreveu a intervenção no Afeganistão como um "total desperdício".
Os EUA começaram a atacar o Afeganistão em 7 de outubro de 2001 para vingar os atentados de 11 de setembro daquele ano em Nova York e no Pentágono, cometidos pela rede terrorista Al Caeda, que vivia sob a proteção do regime islamita da milícia extremista muçulmana dos Talebã (Estudantes).
Quando o saudita Ossama ben Laden e parte da cúpula d'al Caeda escaparam na Batalha de Tora Bora, em dezembro de 2001, o então presidente George Walker Bush desviou os esforços e recursos dos EUA para invadir o Iraque de Saddam Hussein em março de 2003.
Com a negligência americana, os Talebã sempre incomodaram o governo sustentado pelos EUA. O presidente Barack Obama fez campanha prometer retirar as tropas americanas do Iraque e do Afeganistão. Acabou saindo do Iraque por não chegar a um acordo com o então primeiro-ministro Nuri al-Maliki para garantir imunidade aos soldados americanos.
Diante do surgimento e do crescimento da organização terrorista Estado Islâmico do Iraque e do Levante, Obama decidiu enviar mais forças ao Iraque e manter no Afeganistão um contingente capaz de entrar em combate, ainda que sua missão principal fosse até agora assessorar as forças de segurança afegãs.
Trump está decidido a se mostrar capaz de usar a força. Prometeu a vitória sem definir o que considerará vitória. Para o ex-comandante militar da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), general Wesley Clark, a "nova estratégia" do presidente mais parece uma jogada para sair por cima.
Ao analisar a situação na televisão americana CNN, o comentarista Fareed Zakaria observou que a estratégia de Trump implica em ocupar o Afeganistão durante um longo tempo. Os Talebã controlam hoje quase a metade do território afegão, uma das razões do presidente para intensificar a guerra.
A ajuda militar dos EUA ao Afeganistão equivale a 40% do produto interno bruto do país. Se levar em conta toda a ajuda americana, deve superar o PIB afegão. Sem os EUA e sua ajuda econômica, o governo fatalmente cairia. Os Talebã estão certo disso. Esperam retomar o poder com a saída dos americanos.
Quando ao Paquistão, comentou Zakaria, "todo o suprimento das forças americanas passa pelo Paquistão. Como vamos pressionar o Paquistão? Dependemos do Paquistão para fazer a guerra no Afeganistão."
O que disse Trump? "Não podemos mais ficar em silêncio enquanto o Paquistão for um refúgio para organizações terroristas como os Talebã e outros grupos que são uma ameaça para a região e além dela. O Paquistão tem muito a ganhar como parceiro de nossos esforços no Afeganistão. Tem muito a perder se continuar abrigando terroristas."
Os EUA não esquecem que o líder supremo da Caeda, Ossama ben Laden, estava escondido numa mansão em Abotabade, perto da principal academia militar do Paquistão, um país dominado pelas Forças Armadas desde a independência do Império Britânico e da divisão da Índia, há 70 anos.
As Forças Armadas paquistanesas negaram que o país seja usado como base para terroristas atacarem outros países. É uma grande mentira.
Os militares paquistaneses usam grupos extremistas muçulmanos para fustigar a Índia, inimiga histórica, e fomentam a instabilidade do Afeganistão, apoiando a milícia dos Talebã e a Rede Hakkani, uma espécie de braço armado do Exército do Paquistão na guerra civil afegã.
Aliado da China, ambos são inimigos da Índia, o Paquistão pode resistir tranquilamente a sanções dos EUA.
"Não vamos construir nações, vamos matar terroristas", afirmou o presidente. "Se sairmos rapidamente, as consequências são previsíveis e inaceitáveis." Ele prometeu dar carta branca aos generais para que empreguem a força necessária para a vitória.
Mas, sem um governo e uma economia que funcionem, será impossível vencer a guerra e conquistar a paz. Trump disse que levou tempo estudando o Afeganistão "sob todos os ângulos". Não aprendeu muito.
O Afeganistão é chamado de "cemitério dos impérios". Desde Alexandre, o Grande, considerado um dos maiores generais de todos os tempos, que morreu em 323 antes de Cristo, foi campo de batalha para vários impérios que não conseguiram subjugá-lo, nem os mongóis, nem os britânicos, nem os russos e nem a União Soviética.
Este é o blog do jornalista Nelson Franco Jobim, Mestre em Relações Internacionais pela London School of Economics, ex-correspondente do Jornal do Brasil em Londres, ex-editor internacional do Jornal da Globo e da TV Brasil, ex-professor de jornalismo e de relações internacionais na UniverCidade, no Rio de Janeiro. Todos os comentários, críticas e sugestões são bem-vindos, mas não serão publicadas mensagens discriminatórias, racistas, sexistas ou com ofensas pessoais.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário