Apesar de ter autorizado a invasão da Baía dos Porcos, em
Cuba, do início da conspiração para derrubar o presidente João Goulart e do
incessante revisionismo histórico, John Fitzgerald Kennedy (1961-63), assassinado há 50 anos, foi um dos melhores e mais populares presidentes dos Estados Unidos e até hoje é o mais popular. Foi o primeiro presidente da era da televisão.
No momento decisivo de sua Presidência de apenas mil dias, a
Crise dos Mísseis em Cuba, em outubro de 1962, quando o mundo esteve mais perto
do que nunca de uma guerra nuclear, Kennedy controlou os falcões e cercou a
ilha, em vez de invadi-la. Em vez de chamar de "bloqueio", usou a palavra "quarentena" para disfarçar.
JFK também foi decisivo ao resistir à pressão soviética para
abandonar Berlim Ocidental depois da construção do muro, em 13 de agosto de
1961. Em 1963, durante meses, tanques soviéticos e americanos estiveram frente
à frente nas ruas da atual capital da Alemanha.
Em discurso em Berlim, Kennedy pronunciou, em alemão, uma de suas
frases mais célebres: “Todos os homens livres, onde quer que vivam, são
cidadãos de Berlim. Portanto, como um homem livre, tenho orgulho das palavras:
‘Ich bin ein Berliner’ (Eu sou um berlinense)”.
No centenário da Proclamação da Abolição, em 1963, Kennedy
mandou tropas federais proteger os estudantes negros que não tinham proteção da
polícia de estados racista.
A legislação de direitos civis foi aprovada no governo
Lyndon Johnson, lembrou Luiz Fernando Veríssimo sem disfarçar o cacoete
esquerdista de querer diminuir os heróis dos EUA. Mas a proposta era de JFK. Há
um telefonema de Johnson para o pastor Martin Luther King Jr. prometendo
aprovar as leis que garantiram direitos iguais para os negros.
Se o homem chegou à Lua, foi Kennedy quem mandou ao lançar
seu programa especial como um desafio: “Queremos ir à Lua não por que seja
fácil, mas porque é difícil”. Era um novo teste à capacidade tecnológica dos
EUA depois que a União Soviética tinha dado um salto à frente com o primeiro
satélite artificial da Terra, o Sputnik, em 1957, e ao mandar o primeiro homem
ao espaço, Yuri Gagarin, em 1961.
Mais jovem presidente a chegar à Casa Branca, com apenas 43
anos e uma linda mulher de 31 anos, Kennedy foi o primeiro político da era da
televisão. Soube usar sua própria imagem e da primeira família como um apelo
irresistível. As fotos dos filhos pequenos brincando no Salão Oval da Casa
Branca são históricas.
Sua vitória sobre o então vice-presidente Richard Nixon em
1960, na eleição presidencial com maior participação do eleitorado da História
dos EUA, foi selada nos primeiros debates presidenciais televisionados.
Como observou o sociólogo canadense e guru da comunicação
Marshall McLuhan em Os Meios de
Comunicação como Extensões do Homem, Kennedy parecia o xerife simpatico e
bonachão de uma cidadezinha do interior, sem todas as respostas na ponta da
língua, mas passando sinceridade e boa vontade.
Suando e mal bardeado, Nixon, comparou McLuhan, estava mais
para o advogado da estrada de ferro que chega à cidadezinha para ferrá-la. Até
hoje o debate é estudado. Ronald Reagan repetiu literalmente uma pergunta no
seu debate com Jimmy Carter em 1980, aconselhando os eleitores a votar na
oposição se estivessem menos ricos do que quatro anos antes.
Com sua elegância de origem francesa, um charme a mais para
a sociedade americana, Jaqueline Kennedy redecorou a Casa Branca e a abriu pela
primeira vez para as câmaras de televisão. Era tão popular na França que numa
entrevista em Paris ele se apresentou assim: “Sou o homem que está acompanhando
Jaqueline Kennedy em sua visita à Europa”.
Jackie não gostava do carro aberto. Sua imagem de dor e
dignidade diante da morte do marido sensibilizou o mundo inteiro. O funeral de
Kennedy reforçou o papel ritual da TV em grandes cerimônias, aquele cortejo
lento com os irmãos do presidente, a viúva e chefes de Estado e de governos
estrangeiros seguindo em marcha fúnebre, Jackie, Bob e Ted Kennedy caminhando
de costas para não dar as costas ao presidente.
Nesses últimos 50 anos desde que os tiros calaram o político
mais popular do planeta numa cidade sombria de um estado conservador e
reacionário como o Texas, as críticas ao governo Kennedy se avolumaram. Estão
em livros como O Lado Negro de Camelot, de Seymour Hersh, que explora relações extraconjugais e ligações com a máfia.
Kennedy era um homem dos anos 1960s. Alega-se até que foi o primeiro presidente a fumar maconha na Casa Branca.
ASSASSINATO
Sua própria morte é um mistério. A versão oficial é que JFK
foi morto por Lee Harvey Oswald, um ex-fuzileiro naval que estivera na União
Soviética. Dois dias depois, diante das câmeras de TV, ao vivo, Jack Ruby matou
Oswald, ajudando a enterrar o mistério.
Daí vem suspeitas de vingança da máfia, que teria apoiado a
eleição de Kennedy e até ajudado o presidente a ter um caso com a atriz Marylin
Monroe, que cantou parabéns para JFK na Casa Branca num de seus aniversários.
A Comissão Warren, presidida pelo presidente da Suprema
Corte na época, Eral Warren, concluiu que Oswald tinha sido o único responsável
pela morte. Mas a maioria duvida que tenha agido sozinho.
Kennedy criou a Aliança para o Progresso para o desenvolvimento da América Latina, mas a preocupação era com a segurança nacional.
Em plena Guerra Fria, Kennedy levou adiante um plano de invadir Cuba formulado por Nixon no governo Dwight Eisenhower e não se opôs à articulação do golpe contra Jango. É improvável que outro presidente dos EUA pudesse agir de outra maneira. Os republicanos eram muito mais direitistas. Costumavam acusar os democratas de “perder a China”, que caiu sob o comunismo no governo Harry Truman (1945-63).
Em plena Guerra Fria, Kennedy levou adiante um plano de invadir Cuba formulado por Nixon no governo Dwight Eisenhower e não se opôs à articulação do golpe contra Jango. É improvável que outro presidente dos EUA pudesse agir de outra maneira. Os republicanos eram muito mais direitistas. Costumavam acusar os democratas de “perder a China”, que caiu sob o comunismo no governo Harry Truman (1945-63).
Pelo mesmo motivo, Kennedy mandou milhares de assessores
militares dos EUA para o Vietnã. Naquela época, os EUA acreditavam na teoria do dominó. Se um país caísse sob o comunismo, os outros viriam atrás. A participação direta na Guerra do Vietnã começa em
1964, depois que o governo Johnson forjou o Incidente do Golfo de Tonkin.
Apesar de todos os seus muitos defeitos, Kennedy acertou em
questões essenciais como na Crise dos Mísseis, na defesa de Berlim e na defesa
de direitos iguais para negros e brancos. A suposição de que poderia ter negociado o desarmamento com
a URSS duas décadas antes de Reagan não tem muita consistência. Com quem
Kennedy negociaria, com Leonid Brejnev?
Acima de tudo, foi um presidente que renovou a fé e a
esperança, que talvez seja a maior obrigação de um líder político.
No seu discurso de posse, declarou: “Não pense no que seu país
pode fazer por você. Pense no que você pode fazer pelo seu país”, pregando um
sentimento de solidariedade que o individualismo crescente nas últimas décadas
parece ter descartado.
Num balanço final, por maiores que sejam as críticas, JFK
foi muito melhor do que Lyndon Johnson, Richard Nixon, Gerald Ford, Jimmy
Carter, Ronald Reagan, os dois George Bush e Bill Clinton.
A direita pode alegar que Reagan ganhou a Guerra Fria, mas o
degelo se deveu muito mais ao líder soviético Mikhail Gorbachev e sua decisão
de reformar o irreformável comunismo soviético do que às ações midiáticas do
Grande Comunicador, como era conhecido o outrora canastrão de Hollywood.
Graças à revolução da tecnologia da informação, Clinton
presidiu os EUA numa década de grande prosperidade. Mas era da ala conservadora
do Partido Democrata e, pela primeira vez em décadas, o partido teve dois
candidatos do Sul, sinal da guinada à direita.
Clinton se omitiu no genocídio em Ruanda e não aproveitou a
década de total supremacia dos EUA para tentar modernizar as instituições
internacionais do sistema ONU, além de descuidar da regulamentação do mercado
financeiro, embarcando no neoliberalismo republicano.
O primeiro democrata do Norte dos EUA a conquistar a Casa
Branca depois de Kennedy foi Barack Obama. É também o mais próximo
ideologicamente do presidente morto, uma espécie de herdeiro político.
Quando Kennedy foi morto, há exatamente 50 anos, eu era um
menino de apenas 9 anos. Na minha inocência, imaginei que só poderia ter sido a
URSS. A guerra nuclear seria inevitável. A morte era certa, pelo menos a morte
da inocência.
Sua morte foi o prenúncio de uma década trágica nos EUA. Em
1968, seriam mortos o líder negro Martin Luther King e Bob Kennedy, baleado no
dia em que venceu a eleição primária na Califórnia, conquistando a candidatura
democraca para a Casa Branca.
Com os Kennedy e Kuther King, morreram também o sonho e as esperanças dos anos 60. O sonho de Obama ficou muito aquém.
Com os Kennedy e Kuther King, morreram também o sonho e as esperanças dos anos 60. O sonho de Obama ficou muito aquém.
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