segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

Rebeldes hutis matam ex-ditador do Iêmen

O ex-ditador Ali Abdullah Saleh, que mandou no Iêmen de 1978 até cair na Primavera Árabe, em fevereiro de 2012, foi morto hoje em Saná, a capital do país, pelos rebeldes hutis, xiitas zaiditas apoiados pelo Irã, que dias atrás eram seus aliados.

Saleh foi eleito presidente do antigo Iêmen do Norte, em 1978, e foi o principal responsável unificação do mais pobre entre os países árabes, em 1990, unindo o Iêmen do Norte, tribal, ligado à Arábia Saudita, ao Iêmen do Sul, que foi a única república socialista árabe.. Depois de sua queda, os hutis aproveitaram a situação caótica e ocuparam a capital iemenita em setembro de 2014.

Em 21 de janeiro de 2015, o presidente Abed Rabbo Mansur Hadi foi o obrigado a renunciar pelos hutis. Ele conseguiu fugir da prisão domiciliar no mês seguinte e foi para o porto de Áden, a antiga capital do Iêmen do Sul, onde chegou em 21 de fevereiro, para organizar a resistência.

Quando o Supremo Comitê Revolucionário dos hutis consolidou o poder em Saná, em 21 de março de 2015, convocou uma mobilização geral para derrubar Hadi e tomar as outras províncias que não estavam sob seu controle. As forças de Saleh atacaram Áden.

Hadi fugiu para a Arábia Saudita, que intervém militarmente na guerra civil do Iêmen desde 25 de março de 2015, principalmente com bombardeios aéreos, mas também com forças terrestres, junto com outros países árabes.

Entre os aliados na coalizão saudita, estão Egito, Marrocos, Jordânia, Bahrein, Catar, Emirados Árabes Unidos, Kuwait e Sudão. A Eritreia, Djibúti e a Somália abriram seu espaço aéreo à aliança, apoiada pelos Estados Unidos, que faziam ataque de drones no país contra a rede terrorista Al Caeda na Península Arábica até sair por razões de segurança. O grupo Estado Islâmico do Iraque e do Levante também se infiltrou no caos do Iêmen.

A intervenção faz parte da estratégia da Arábia Saudita e seus aliados majoritariamente sunitas para conter a expansão do Irã, xiita, reforçada com a ascensão do príncipe herdeiro Mohamed ben Salman a homem-forte do reino. Com a queda do ditador sunita Saddam Hussein e a ascensão da maioria xiita ao poder no Iraque, e a intervenção militar iraniana em apoio ao ditador Bachar Assad na Síria, consolida-se um crescente xiita, que vai ao Irã até o Mar Mediterrâneo.

Em 2 de dezembro, Saleh anunciou a ruptura da aliança com os hutis e aderiu à coalizão saudita que tenta reinstalar Hadi no poder em Saná. Até ontem, pelo menos cem pessoas haviam sido mortas em combates entre as forças leais a Saleh e os hutis. Sua casa estava cercada. Ele foi morto quando tentava fugir em meio à batalha.

"Saleh calculou mal sua jogada? Os sauditas e os EAU cantaram a vitória cedo demais?", perguntava ontem um analista da televisão catarina especializada em notícias Al Jazira. "Os hutis sabiam que mais cedo ou mais tarde Saleh iria se voltar contra eles. Estavam bem preparados para este momento e prontos a reagir", observou o sociólogo iemenita Baki Chamsan, professor da Universidade de Áden.

Nas redes sociais, circulam fotos de Saleh ao lado dos outros ditadores derrubados na Primavera Árabe: Zine Abidine ben Ali, da Tunísia; Hosni Mubarak, do Egito; e Muamar Kadafi, da Líbia. A maioria não lamentou: "Ele morreu como reinou durante quase 40 anos no Iêmen, na base da astúcia e da traição permanente", criticou o comentarista iemenita Khaled al-Ansi, na Al Jazira.

"Morte de Saleh, caos, ameaças na região, ingerência iraniana, tudo por causa da recusa em seguir o curso da história, de rejeitar a Primavera Árabe, de negar o direito dos povos à liberdade. Se a Arábia Saudita houve apoiado a Primavera Árabe, em 2011...", analisou o jornalista saudita exilado Khaled Kashoggi.

"Com todas as minhas desculpas aos mártires da revolução, não nos consola o fato de que ele fosse morto desta maneira, assassinado pelos hutis", lamentou no Twitter o jornalista iemenita Wassim al-Querchi. "Ele prestou um serviço ao país antes de morrer, ao corrigir o erro de sua aliança com os hutis."

Mais radical e esperançoso, o intelectual Mohamed Mokhtar al-Chinguiti, da Mauritânia, vê "um novo capítulo da Primavera Árabe. Saleh morreu seis anos depois de Kadafi. O livro da Primavera Árabe continua a surpreender o mundo. Ele continuará a ser escrito com letras vermelhas até que os povos árabes tenham liberdade e dignidade."

Mais de 10 mil pessoas foram mortas na guerra civil do Iêmen, talvez o conflito mais brutal hoje no mundo à medida que a guerra civil na Síria parece mais perto do fim, estima o Conselho de Relações Exteriores dos EUA. Cerca de 2,9 milhões fugiram de casa e 17 milhões sofrem de insegurança alimentar. O cerco saudita a áreas dominadas pelos rebeldes está causando fome em massa.

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