O Movimento de Resistência Islâmica (Hamas), um grupo fundamentalista muçulmano considerado terrorista pelos Estados Unidos e a Europa, lançou hoje um ataque sem precedentes, com bombardeio de mísseis e invasão por terra de mil homens ao território israelense, e tomada de pelo menos 100, talvez centenas de reféns. O total de mortos passa de 1.100, dos quais 700 israelenses e pelo menos 413 palestinos.
A reação ao maior ataque a Israel desde a Guerra do Yom Kippur, há 50 anos, será duríssima. Foi uma ação suicida da liderança do Hamas, mas Israel terá de lidar com a situação dos reféns, que provavelmente serão usados como escudos humanos.
O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu declarou guerra ao Hamas e deve anunciar uma invasão terrestre de Gaza, o que não acontece desde 2014, para eliminar toda a liderança e a infraestrutura do Hamas. Isto pode criar um vácuo de poder em Gaza, um verdadeiro inferno na Terra, ou exigir uma longa ocupação.
O ataque coordenado por ar, terra e mar, com 5 mil foguetes de acordo com o Hamas, 4 mil na versão de Israel, começou às 6h30 (0h30 em Brasília) e a invasão terrestre às 7h40 (1h40 em Brasília). Foi um grande número de foguetes para impedir que o Domo de Ferro, o sistema de defesa antimísseis de Israel, conseguisse abater todos.
O acordo está adiado indefinidamente. A Arábia Saudita condenou o ataque, mas responsabilizou Israel por causa das privações do povo palestino. Vai depender da violência da reação de Israel.
Se um dos objetivos era impedir o estabelecimento de relações entre Israel e a Arábia Saudita, a quem interessa? Ao Irã, que financia e arma o Hamas e o Hesbolá, que disparou foguetes do Sul do Líbano para o Norte de Israel.
O ataque bombardeia o "novo Oriente Médio" que Netanyahu e o ex-presidente norte-americano Donald Trump tentaram criar com o reconhecimento de Israel por países árabes sem um acordo de paz entre israelenses e palestinos.
Mal comparando, porque o Holocausto não tem comparação, os palestinos estão na mesma situação do povo judeu antes da existência de Israel. Não tem um Estado Nacional e um exército que os defenda. Esta função deveria ser exercida pelos países árabes.
O Egito, que tem a maior população e o maior exército do mundo árabe, fez a paz com Israel em 1978 para recuperar a Península do Sinai, ocupada na Guerra dos Seis Dias (1967) junto com a Faixa de Gaza e a Cisjordânia, inclusive o setor oriental (árabe) de Jerusalém.
Depois que os Emirados Árabes Unidos, o Bahrein, o Sudão e o Marrocos reconheceram Israel e estabeleceram relações com o Estado judaico, a Arábia Saudita passou a ser a última grande esperança do movimento nacional palestino.
Nas últimas semanas, as negociações entre Israel e a Arábia Saudita se aceleraram. "Cada vez estamos mais perto", declarou o príncipe herdeiro Mohamed ben Salman, o ditador saudita, há três semanas. Em seguida, pela primeira vez, ministros israelenses pisaram em território saudita.
CONVOCAÇÃO
O ataque do Hamas é um gesto de desespero e um alerta geral ao Oriente Médio. O grupo extremista palestino convocou os outros grupos armados palestinos e o Hesbolá a entrar na guerra. A população libanesa não quer guerra porque Israel costuma destruir a infraestrutura do país.
Gaza é um inferno, uma faixa de areia estreita superpovoada, com mais de 2 milhões de habitantes, praias às vezes bloqueadas para banhistas e pescadores palestinos, e índice de desemprego de 47%. É uma prisão a céu aberto. Grande parte dos moradores de Gaza trabalha em Israel. Agora, a entrada em Isral será dificultada, outra maneira de exercer pressão.
Israel devolveu Gaza aos palestinos em 2005, e o Hamas tomou o poder no território numa guerra civil contra a Organização para a Libertação da Palestina (OLP) em 2007. Desde então, o Hamas impõe seu regime de terror ao território e o usou como base para inúmeros ataques e três guerras contra Israel, em 2008-9, 2014 e agora.
A única solução para com esta guerra sem fim que vez desde a fundação de Israel, em maio de 1948, é um acordo de paz com a criação de um Estado Nacional palestino que conviva em paz com o Estado judaico, como previa a decisão das Nações Unidas que criou Israel em 1947.
Nos últimos anos, o governo direitista de Israel se nega a negociar a paz enquanto amplia a colonização da Cisjordânia ocupada. Uma das alegações é que um governo palestino na Cisjordânia poderia ser capturado pelo Hamas, que se tornaria um inimigo muito mais poderoso com uma base territorial maior do que tem em Gaza.
O atual governo de extrema direita, no poder desde dezembro do ano passado, agravou a situação. Tem claramente a intenção de anexar a Cisjordânia. O aumento da violência na Cisjordânia e uma onda de protestos contra uma reforma judiciária para blindar Netanyahu contra processos de corrupção tiraram o foco da inteligência israelense de Gaza e do Hamas. Este ataque é um tremendo fracasso de inteligência.
Se integrar a população árabe, hoje 20% do total de habitantes, mas com taxa de natalidade maior, com o tempo, os judeus podem virar minoria. As opções seriam uma limpeza étnica ou a criação de um regime de apartheid, relegando os palestinos a uma posição de cidadãos de segunda classe.
A alternativa à paz é esta guerra sem fim.
3 comentários:
Muito bom! Não me lembrava da aproximação recente com os sauditas, nem tinha atinado para o que isso representa na cabeça dos palestinos.
Muito esclarecedor. Também não lembrava mais de como o Hamas tomou o poder em Gaza contra a OLP de Arafat.
Ah, professor
Concentradissima na leitura : " Gaza é um inferno" - fiz pausa.É a tragicomédia na oração.
Te vi na globonews
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