segunda-feira, 21 de agosto de 2023

Candidato anticorrupção é eleito presidente da Guatemala

 Com 58% dos votos, Bernardo Arévalo, do Movimento Semente, filho do primeiro presidente eleito democraticamente da história da Guatemala, conquistou no domingo uma vitória histórica para presidir o país mais rico da América Central. 

Arévalo, de centro-esquerda, venceu no segundo turno a ex-primeira-dama Sandra Torres Casanova, da União Nacional da Esperança (UNE), que teve 37% por cento dos votos. Seu maior desafio será enfrentar a corrupção endêmica.

O presidente Juan José Arévalo Bermejo (1945-51) foi eleito depois da Revolução Democrática, em 1944. Durante seu governo, houve mais de 30 tentativas de golpe.

Seu sucessor, Jacobo Árbenz Guzmán, foi deposto em 27 de junho de 1954 no primeiro golpe militar articulado pela CIA (Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos) na América Latina durante a Guerra Fria, por fazer a reforma agrária em terras da companhia bananeira norte-americana United Fruit.

A Guatemala cai então num período de instabilidade. Em 1960, começa uma das mais sangrentas guerras civis da Guerra Fria na América Latina, que dura 30 anos e mata cerca de 200 mil pessoas até a redemocratização, em 1994, quando o país tinha 9 milhões de habitantes. O presidente eleito hoje nasceu em 7 de outubro de 1958 no Uruguai, onde o pai estava exilado.

A ditadura militar foi responsável por 92% das mortes, a maioria destas (83%) de indígenas de origem maia, uma das três grandes civilizações pré-colombianas, num verdadeiro genocídio.

Em 12 de dezembro de 2006, um acordo com as Nações Unidas cria a Comissão Internacional Contra a Impunidade na Guatemala (CICIG), com os objetivos de investigar atos ilícitos das forças de segurança e de organizações clandestinas, combater a corrupção e o crime organizado.

A CICIG acusou de corrupção em 16 de abril de 2015 vários dirigentes políticos, inclusive Juan Carlos Monzón, secretário particular da vice-presidente Roxana Baldetti. Isso levou à renúncia de Baldetti e do presidente, general Otto Pérez Molina (2012-15).

Com a desmoralização dos políticos, em 2015, foi eleito presidente o ator e comediante Jimmy Morales (2016-20), mas a corrupção não diminuiu. Em janeiro de 2017, foram presos o irmão mais velho, Samuel Morales, e um filho do presidente, José Manuel Morales, por corrupção e lavagem de dinheiro.

Sete meses depois, Jimmy Morales expulsou o presidente da comissão da ONU, que investigava alegações de que seu partido recebera doações de campanha ilegais, inclusive de traficantes de drogas, e pedira ao Congresso que suspendesse a imunidade do presidente. Morales também foi acusado de receber um bônus ilegal de US$ 7,3 mil por mês do Ministério da Defesa e de abuso sexual de funcionárias públicas.

Em 7 de janeiro de 2019, Morales rompeu o acordo com a ONU e extinguiu a comissão, alegando que cometera atos ilegais e inconstitucionais, e abusos de poder. A CICIG desmantelou 70 organizações criminosas e teria evitado 20 a 30 mil homicídios.

Seu sucessor, o atual presidente, Alejandro Giammattei, foi eleito na quarta tentativa, em 2019, e assumiu o cargo em 14 de janeiro de 2020. Em 21 de novembro daquele ano, começou uma onda de protestos contra a adoção de um orçamento com fundos marcados para obras de infraestrutura de empresas privadas e cortes nos gastos de combate à pobreza e à desnutrição infantil, que afeta a metade das crianças até cinco anos de idade.

A resposta do governo é aumentar a repressão, com assassinato de líderes sindicais, indígenas e ambientalistas denunciadas pela Federação Internacional pelos Direitos Humanos e a Organização Mundial contra a Tortura. 

Em julho de 2021, a procuradora-geral María Consuelo Porras, demitiu o procurador especial anticorrupção, Juan Francisco Sandoval, por investigar casos de corrupção ligados ao presidente, inclusive financiamento ilegal da campanha eleitoral por empresas da construção civil.

Em 2022, o Congresso aprovou um projeto para aumentar as penas de prisão por aborto, proibir a educação sexual nas escolas e declarar homossexuais "grupos minoritários incompatíveis com a moral cristã". Depois de apoiar a iniciativa, Giammattei ameaçou vetar a lei por violar a Constituição e acordos internacionais. O Congresso recuou e suspendeu a tramitação da proposta.

Neste ano, só 2,9% dos guatemaltecos consideraram o governo bom. Sob Giammattei, aumentou muito a imigração para os EUA.

Num país com tal histórico de violência política e corrupção, o partido derrotado ontem denunciou irregularidades e ainda não reconheceu a vitória de Bernardo Arévalo de León, de 64 anos, mas ele foi cumprimentado pelos presidentes do México, Andrés Manuel López Obrador; de Honduras, Xiomara Castro; e de El Salvador, Nayib Bukele.

O atual presidente da Guatemala reconheceu a vitória e convidou Arévalo para uma reunião no palácio presidencial para iniciar a transição de governo.

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