É uma terra de milhares de templos onde o budismo, uma religião pacifista, virou instrumento de dominação e repressão. No Dia das Forças Armadas, os militares que derrubaram o governo civil de Mianmar, a antiga Birmânia, em 1º de fevereiro atiraram hoje contra uma multidão de manifestantes desarmados e mataram 114 pessoas. Entre os mortos, há crianças de 5, 13 e 14 anos.
Pelo menos 420 mianmarenses foram mortos pela repressão desde o golpe militar. Mais de 3 mil foram presos, inclusive o presidente U Win Myint e a líder civil do país, Aung San Suu Kyi, filha do herói da independência do Império Britânico, Aung San, e ganhadora do Prêmio Nobel da Paz de 1991.
Hoje foi o dia mais sangrento. Desta vez. A história registra vários massacres cometidos pelo Exército de Mianmar. No pior, em resposta à rebelião de 8 de agosto de 1988, mais de 3 mil pessoas morreram, embora os militares só admitam 350 mortes.
Desde 1962, ditaduras militares dominam este país do Sudeste Asiático, transformando-o num dos mais pobres do continente, com um breve período democrático recentemente. Em 2015, a Liga Nacional pela Democracia venceu as eleições parlamentares e elegeu 86% dos deputados da Assembleia da União.
Como Suu Kyi é proibida de presidir o país por uma cláusula constitucional feita para impedi-la, por ter sido casada com um estrangeiro e ter filhos com dupla nacionalidade, ela foi nomeada conselheira e se tornou uma espécie de primeira-ministra.
Em pronunciando na televisão, o líder do golpe, general Min Aung Hlaing lembrou que Aung San foi o fundador das Forças Armadas do país, mas não citou a filha, mantida em prisão domiciliar. A ditadura anulou as eleições de 8 de novembro, outra vitória esmagadora da LND. O general prometeu realizar eleições democráticas, sem citar uma data.
Suu Kyi perdeu o prestígio por defender as ações do Exército contra a minoria étnica rohingya, inclusive perante o Tribunal Internacional de Justiça das Nações Unidas, com sede em Haia na Holanda. O arcebispo sul-africano Desmond Tutu, ganhador do Prêmio Nobel de 1984, pediu que o prêmio da líder mianmarense fosse retirado.
Nos Estados Unidos, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, declarou-se "horrorizado pelo banho de sangue provocado pelas forças de segurança, que mostra que a junta sacrificará a vida das pessoas". O chefe da diplomacia dos Estados Unidos elogiou "a coragem do povo de Mianmar ao rejeitar o reino de terror dos militares."
O secretário-geral da ONU, António Guterres, ex-primeiro-ministro de Portugal, condenou o massacre "nos termos mais duros". Mas o povo de Mianmar precisa de muito mais do que elogios dos EUA e condenações formais da ONU. Nas ruas de Yangum, Mandalay e Naipidau, pedem uma intervenção internacional e acusam a China de apoiar o golpe.
Um comentário:
Em princípio deve-se ser contra toda espécie de golpe de Estado, mas quando se vê os Estados Unidos contra não pode ser um bom sinal. Pode ter certeza que os atuais governantes contrariam interesses americanos no país.
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