Em uma dura crítica ao governo brasileiro, o embaixador Paulo Roberto de Almeida, professor do Centro de Estudos Universitários de Brasília (CEUB), afirmou que o Brasil não tem uma "grande estratégia, vive de improvisações". Ele citou o escritor Mario de Andrade para afirmar que o Brasil cresce por uma fatalidade, apesar de suas políticas públicas.
A Rodada Doha de negociações de liberalização comercial da Organização Mundial do Comércio (OMC) está sem perspectivas de conclusão. Pelo menos foi possível evitar o "pior do protecionismo" depois da recessão mundial, observou o diplomata, ao analisar o cenário internacional no seminário A agenda econômica internacional do Brasil, realizado ontem no Rio de Janeiro para marcar o quinto aniversário do Cindes (Centro de Estudos de Integração e Desenvolvimento).
O comércio exterior brasileiro, sobretudo de produtos industrializados, sofre com a desvalorização do real, que "dá uma falsa impressão de riqueza" e leva a uma "condescendência e acomodação" do governo, acrescentou o diplomata e professor: "Sobra dinheiro no mundo. Daqui a pouco, a gente passa a China em investimento externo".
Realmente, só as empresas dos Estados Unidos têm US$ 2 trilhões em caixa. Há mais interesse em investir em países com taxas de crescimento mais elevadas, como China, Índia e Brasil, do que em casa.
Almeida criticou a Estratégia Nacional de Defesa, formulada pelo ex-ministro de Assuntos Estratégicos Roberto Mangabeira Unger, que voltou para a Universidade de Harvard: "Seria necessário um PIB 10, 15 vezes maior". E chamou o Plano Brasil 2022, do embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, que substituiu Mangabeira Unger, de "megalomaníaco".
Almeida não poupou o carro-chefe do governo Dilma Rousseff, a proposta para acabar com a pobreza extrema: "O plano contra a miséria vai agravar a miséria ao permitir a inclusão de até cinco filhos no Bolsa-Família." Em outro momento, foi irônico: "Temos um governo que adora o capital, mas odeia o capitalismo."
O que seria bom para o Brasil, na visão do diplomata? Uma abertura maior do comércio internacional no setor agrícola, em que o país é altamente competitivo. Em segundo lugar, a conversibilidade do real, em vez de tentar negociar em moedas nacionais. E também o relançamento das negociações internacionais sobre investimentos, o que no momento parece politicamente inviável.
"Mas a Unasul (União das Nações da América do Sul) está mais preocupada com uma estratégia de defesa conjunta. Contra quem?", alfinetou.
No plano interno, o professor entende que "o maior problema é fiscal" e que "uma reforma da governança é difícil". O Brasil tem enormes problemas de infraestrutura e, com as cartilhas que vemos por aí, "a educação não corre nenhum risco de melhorar. Só faremos reformas em caso de crise. O próprio Supremo Tribunal Federal se rendeu ao domínio do Executivo".
Ele aponta uma "série de erros", como "um distributivismo exacerbado, que vai até camisinhas em motéis", o que pode ser defendido em nome da saúde pública, e culpa a carga fiscal e não a China pela desindustrialização do país.
"Mesmo assim, o Brasil se move, apesar do atraso na academia e na classe política", concluiu, "porque o progresso, como diz um poema de Mario de Andrade, também é uma fatalidade".
O trecho é de O poeta come amendoim, escrito em 1924:
"Progredir, progredimos um tiquinho...
Que o progresso também é uma fatalidade..."
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