segunda-feira, 19 de outubro de 2020

Candidato socialista ganha eleição no primeiro turno na Bolívia

O ex-ministro de Economia e Finanças Luis Alberto Arce Catacora, responsável pelo milagre econômico boliviano, do Movimento ao Socialismo (MAS), partido do ex-presidente Evo Morales, venceu a eleição presidencial na Bolívia no primeiro turno. 

De acordo a pesquisa de boca de urna da empresa Ciesmori para a Unitel (Universal de Televisão), Arce recebeu 52,4% dos votos contra 31,5% para o ex-presidente Carlos Mesa, da Comunidade Cidadã, e 14,1% para Luis Fernando Camacho, da aliança ultradireitista Creemos.

As eleições escolhem um novo presidente e uma nova Assembleia Nacional com legitimidade popular para superar a crise gerada pela anulação da eleição presidencial de 20 de outubro do ano passado e a renúncia do presidente Evo Morales, em 10 de novembro, sob pressão das Forças Armadas, da Polícia e da Central Operária Boliviana (COB), em meio a protestos por fraude eleitoral atestada por missão da Organização dos Estados Americanos (OEA).

Os resultados oficiais saem daqui a alguns dias, mas a presidente interina, Jeanine Áñez e o ex-presidente Jorge Quiroga, que chegou a se lançar candidato e desistiu, cumprimentaram Arce como presidente eleito. Mesa reconheceu a derrota na manhã desta segunda-feira.

No discurso da vitória, Arce prometeu fazer um governo de união nacional e retomar as reformas econômicas e sociais da era Morales, quando o país cresceu acima de 5% ao ano, o produto interno bruto passou de US$ 9,5 bilhões a US$ 40,8 milhões e a pobreza caiu de 60% para 37% da população, hoje de 11,7 milhões de habitantes. 

Do exílio na Argentina, o ex-presidente festejou o triunfo: "Todos os dados conhecidos até agora sinalizam a vitória do MAS", que também terá maioria na Câmara e no Senado. Ele presidente voltar ao país "cedo ou tarde".

Primeiro índio a presidir a Bolívia, Morales chegou ao poder em janeiro de 2006 como líder do movimento indígena e dos produtores de folha de coca uma cultura tradicional dos nativos da Cordilheira dos Andes depois de um período de instabilidade e queda de presidentes. Convocou uma Assembleia Constituinte para tornar a Bolívia um Estado plurinacional, reconhecendo as nações indígenas. Reelegeu-se em 2009, sob a nova Constituição, e em 2014, ganhando sempre no primeiro turno.

Como a Constituição só permitia uma reeleição, Morales convocou um referendo e perdeu, em fevereiro de 2016, por 51,3% a 48,7%. Mesmo assim, não desistiu. Recorreu ao Tribunal Constitucional Plurinacional com base na Convenção Interamericana de Direitos Humanos, e decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos, o Tribunal de São José, na Costa Rica, que considerou o direito de ser candidato um direito fundamental.

Em outubro do ano passado, a apuração preliminar apontava um segundo turno quando o sistema parou de funcionar na noite da eleição. Ao reiniciar a contagem no dia seguinte, Morales disparou na frente e foi declarado vencedor. A missão da OEA apontou várias irregularidades, como urnas com todos os votos no mesmo candidato e urnas com todos os votos preenchidos pela mesma pessoa para favorecer o presidente.

Diante de uma onda de protestos violentos, com mortes, Morales primeiro aceitar realizar nova eleição presidencial e insistiu em ser candidato. No mesmo dia, foi pressionado a renunciar. Com ataques a suas propriedades, refugiou-se em 12 de novembro no México, que denunciou sua queda como um golpe de Estado. Em 12 de dezembro, dois dias depois da posse do presidente peronista Alberto Fernández, foi para a Argentina.

Junto com Morales, renunciaram o vice-presidente Álvaro García Linera e os presidentes e vice-presidentes da Câmara e do Senado, deixando o país acéfalo. Assumiu a presidência a 2ª vice-presidente do Senado, Jeanine Áñez, que prometeu não se candidatar, acabou se candidatando e desistiu para fortalecer a candidatura anti-MAS.

Por causa da pandemia, as eleições foram adiadas duas vezes. Ativistas do MAS e do movimento indígena chegaram a bloquear estradas para pressionar o governo interino. Em julho, o Tribunal Supremo Eleitoral marcou as eleições para este domingo.

A Bolívia é o quarto país do mundo em número de mortes de covid-19 por habitante, excluindo os micropaíses São Marinho e Andorra, atrás apenas do Peru, da Bélgica e da Espanha, logo à frente do Brasil. O fracasso do governo interino da direita no combate à pandemia e o caos dos últimos meses deram a vitória ao MAS. Áñez prometera fazer apenas um governo de transição até novas eleições, mas tentou tomar medidas impopulares como uma reforma trabalhista e a digitalização da educação.

O partido socialista boliviano se mostrou maior do que Morales. Pela análise de um comentarista político boliviano, o eleitor que não votou nele em outubro do ano passado por discordar de uma terceira reeleição voltou ao MAS por causa dos princípios e dos valores do partido, e do sucesso da economia sob a liderança de Arce como ministro.

O presidente eleito é mais moderado do que Morales. Não citou o ex-presidente no discurso da vitória. Prometeu unir o país e governar para todos os bolivianos. O vice-presidente David Choquehuanca é mais radical. É um defensor incondicional da ditadura de Nicolás Maduro na Venezuela. Por isso, foi preterido para a Presidência pelo mais pragmático Arce.

A vitória do MAS é mais uma derrota da política externa do governo Jair Bolsonaro. Depois da queda de Morales, o chanceler Ernesto Araújo chegou a receber Camacho, o candidato da extrema direita nessas eleições bolivianas.

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