quarta-feira, 29 de novembro de 2023

Morre o diplomata mais influente da segunda metade do século 20

 O ex-secretário de Estado norte-americano e ex-assessor de Segurança Nacional da Casa Branca Henry Kissinger, o diplomata mais importante da segunda metade do século 20, responsável pela reaproximação entre os Estados Unidos e a China e pelo apoio incondicional a Israel, morreu hoje aos 100 anos. 

Estrategista genial e implacável, é considerado um criminoso de guerra pelo apoio a golpes militares, inclusive na América Latina, e pelos bombardeios no Sudeste Asiático durante a Guerra do Vietnã (1955-75), mas ganhou o Prêmio Nobel da Paz pelo acordo com o Vietnã do Norte, um dos mais controversos da história.

Heinz Alfred Kissinger nasceu em 27 de maio de 1923 em Fürth, na Baviera, no Sul da Alemanha, em uma família de judeus que foge do nazismo e vai para os EUA em 1938, onde ele se naturaliza norte-americano e muda de nome para Henry. Volta à Europa como soldado do Exército dos EUA na Segunda Guerra Mundial (1939-45).

Aluno brilhante da prestigiada Universidade de Harvard, uma das melhores do mundo, faz sua tese de doutorado sobre a reconstrução da ordem internacional na Europa depois das guerras napoleônicas, chamada Paz de 100 Anos, quando houve guerras como a Guerra da Crimeia e as guerras de unificação da Itália e da Alemanha, mas não um conflito generalizado na Europa como nas guerras napoleônicas e nas guerras mundiais.

Diante dos horrores da guerra, especialmente do Holocausto, ele dedicou sua vida para evitar a repetição de uma catástrofe de tais dimensões

Henry Kissinger é nomeado assessor de Segurança Nacional dos EUA no primeiro governo Richard Nixon (1969-73) e depois secretário de Estado (1973-77), cargo que ocupa até o fim do governo Gerald Ford, que assume após a renúncia de Nixon por causa do Escândalo de Watergate.

Mestre da realpolitik, da política da força, do realismo político, costumava se desculpar: "Às vezes, um estadista tem de escolher entre dois males." Kissinger era a favor do equilíbrio de forças (balance of power, em inglês), um arranjo que contemple todas as partes que tenham algum poder, mas não quem tem poder, entendido como força militar

Ele participa das negociações para retirar os EUA da Guerra do Vietnã, e divide o Prêmio Nobel da Paz com o vietnamita Le Duc Tho, na premiação mais criticada da história do prêmio, e vê uma oportunidade em 1969, quando a União Soviética e a China tem uma série de conflitos na fronteira comum e quase entram em guerra.

Em uma de suas últimas entrevistas, à Bloomberg TV, dias atrás, Kissinger declarou que ele e Nixon entendiam que um país como a China não podia ficar isolado da sociedade internacional. Em 1971, Kissinger faz uma visita-surpresa a Beijim, abrindo o caminho para a visita de Nixon à China e depois à URSS, em 1972, iniciando um período de distensão na Guerra Fria.

Kissinger conseguiu que a China fosse na prática um aliado não membro da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) no fim da Guerra Fria. Ele também conseguiu manter a política externa dos EUA durante o colapso do segundo governo Nixon (1973-74) no Escândalo de Watergate.

No Oriente Médio, Kissinger alinhou os EUA a Israel, especialmente a partir da Guerra do Yom Kippur, quando os EUA fizeram a maior ponte aérea militar da história e entregaram 22,3 mil toneladas de equipamentos militares e munição a Israel no campo de batalha. Kissinger fez a diplomacia da ponte aérea entre os países em guerra para intermediar a paz.

Com a tensão crescente entre os EUA e a China e o risco de uma nova guerra fria, Kissinger foi a Beijim em julho deste ano para insistir que as duas superpotências precisam dialogar e se entender para evitar o risco de uma guerra que seria catastrófica para o mundo inteiro.

As principais acusações são de apoiar ditadores e golpes de Estado no Terceiro Mundo, inclusive no Uruguai, na Argentina e no Chile, os massacres do Paquistão em Bangladesh e da Indonésia no Timor Leste, e também pelos bombardeios ao Camboja, Laos e Vietnã durante a intervenção militar norte-americana na Guerra do Vietnã, matando dezenas de milhares de pessoas.

Por causa dessas acusações e do medo de ser preso, Kissinger quase não saía dos EUA. Foi à China, que não aceita a jurisdição de tribunais internacionais. Gostava de futebol, mas não veio à Copa do Mundo no Brasil.

Nenhum comentário: