A rainha Elizabeth II, da Inglaterra, morreu hoje aos 96 anos no Castelo de Balmoral, na Escócia, no fim do mais longo reinado da história do país e o segundo do mundo, de 70 anos e 214 dias, atrás apenas de Luís XIV, da França, o Rei Sol, que reinou 72 anos e 110 dias, de 1643 a 1715.
Elizabeth II reinou durante a Guerra Fria, a dissolução do Império Britânico, hoje reduzido à Comunidade (ex-Britânica) das Nações, onde era rainha de outros 14 países, a guerra civil na Irlanda do Norte e a entrada e saída da Comunidade Europeia, hoje União Europeia.
Seu filho mais velho ascende ao trono como Charles III. Com 73 anos, é o monarca mais idoso a herdar a coroa britânica.
Ao nascer, em 21 de abril de 1926, Elizabeth Alexandra Mary Windsor era a terceira na linha de sucessão do avô, o rei George V, depois do tio Eduardo e do pai, príncipe Albert. Quando George V morre, em 1936, sobe ao trono Eduardo VIII, que reina de 20 de janeiro a 11 de dezembro e abdica para casar com Wallis Simpson, uma norte-americana divorciada. Seu pai vira rei com o nome de George VI. Elizabeth se torna a primeira na linha sucessória.
GUERRA
Com o início da Segunda Guerra Mundial (1939-45), em 1º de setembro de 1939, e os bombardeios da Força Aérea da Alemanha a Londres, Lorde Hailsham sugere que as princesas Elizabeth e Margaret saiam do país e se refugiem no Canadá. A rainha-consorte Elizabeth rejeita a ideia: “As crianças não vão sem mim. Eu não vou sem o rei. E o rei jamais sairá.”
As princesas vão para o Castelo Balmoral, na Escócia, e depois para a Mansão de Sandringham, em Norfolk, para o Alojamento Real, em Windsor, e finalmente para o Castelo de Windsor, onde passam a maior parte da guerra. No Dia da Vitória, 8 de maio de 1945, as duas se misturam à multidão que festeja nas ruas de Londres.
CASAMENTO
Ela conhece o futuro marido, o principe Philip, da Dinamarca e da Grécia, em 1934. Eles eram primos em segundo grau. Em julho de 1939, aos 13 anos, Lilibet, como era chamada na família, se apaixona por Philip.
Os dois começaram a trocar cartas e se casam em 20 de novembro de 1947. Para isso, Philip teve de renunciar aos títulos grego e dinamarquês e se converter à Igreja Anglicana da Inglaterra, chefiada pelo monarca. O primeiro filho, Charles, nasce um ano depois, em 14 de novembro de 1948. O casal teve mais três filhos: Anne, Andrew e Edward.
RAINHA
Aos 21 anos, em 1947, em pronunciamento para a Comunidade das Nações, Elizabeth promete dedicar sua vida, “seja longa ou curta, ao serviço de vocês e desta grande família imperial da qual fazemos parte.”
Em 6 de fevereiro de 1952, o casal visitava o Quênia quando George VI morreu de câncer de pulmão. Aos 25 anos, Elizabeth II vira rainha da Inglaterra. A coroação acontece em 2 de junho de 1953.
Naquele ano, eles começam uma viagem de 7 meses e 64 mil quilômetros por 13 países. É a primeira rainha a visitar a Austrália e a Nova Zelândia, onde era chefe de Estado. Em 1957, ela faz uma visita de Estado aos Estados Unidos.
Nos anos 1960 e 1970, mais de 20 países da África e do Mar do Caribe se tornam independentes. Em 1972, ao visitar a Iugoslávia, se torna a primeira monarca britânica a ir a um país comunista. Com o fim do império, o Reino Unido entra para a Comunidade Econômica Europeia em 1973.
Em 1977, a banda punk Sex Pistols lança seu maior sucesso, uma paródia do Hino da Inglaterra: “God save the Queen, fascist regime” (Deus salva a rainha, regime fascista). A BBC não tocava, mas a música não foi proibida.
GUERRA DOS PRÍNCIPES
O casamento de Charles com Lady Diana Spencer, em 29 de julho de 1981, na Catedral de São Paulo, em Londres, transmitido para o mundo inteiro pela televisão, revitalizou e rejuvenesceu a monarquia. O casal atrai a atenção da feroz imprensa sensacionalista britânica.
Quando os dois se desentendem, alimentam uma guerra dos príncipes através dos jornais populares. Nos anos 1990, a Guerra dos Príncipes de Gales atinge o ponto de ebulição. 1992 foi o annus horribilis de Sua Majestade: Charles e Diana se separaram, os príncipes Andrew e Sarah Ferguson se separaram e o Castelo de Windsor, o favorito da rainha, pega fogo. A família real concorda em pagar impostos para financiar a restauração do castelo.
Em outubro de 1995, a rainha cai num trote telefônico-radialístico. Um jornalista canadense liga para ela como se fosse o primeiro-ministro Jean Chrétian e pede apoio para evitar a independência dod Quebec, o Canadá francês, num plebiscito. Ela promete ajuda, o que não poderia fazer, já que tinha funções meramente cerimoniais e não pode se meter em política.
CRISE MONARQUIA
A morte de Diana, em 31 de agosto de 1997, provoca a maior crise da monarquia no reinado de Elizabeth II. Como estava separada, Diana não era mais parte da família. Não tinha direito a todas as honras. A rainha estava em férias no Castelo de Balmoral e achou melhor cuidar dos netos.
Diana morre num domingo. O casal real só volta a Londres na quinta-feira, sob pressão de Charles, do primeiro-ministro Tony Blair e da imprensa sensacionalista. Philip, famoso por suas gafes, fala com as pessoas que ficavam 11 a 12 horas na fila diante do Palácio de Buckingham para homenagear a princesa do povo: “Vocês estão aqui há muito tempo?”
A monarquia sobreviveu. Elizabeth II festejou os jubileus de ouro, em 2002, de diamantes, em 2012, e de platina, em 2022. Mas houve mais escândalos casa real.
Em 2011, a rádio e televisão pública britânica revelou que o príncipe Andrew tinha relações com o financista norte-americano Jeffrey Epstein, condenado por violência sexual. Três anos depois, sua ex-mulher, Sarah Ferguson, revelou que Epstein pagara dívidas do príncipe.
Em 20 de dezembro de 2014, dois advogados alegaram na Flórida que Andrew mantivera relações sexuais com uma menor de 16 anos depois identificada como Virginia Giuffre. Ela declarou que recebera US$ 15 mil do magnata para fazer sexo com o príncipe.
Uma ação na Justiça Civil terminou em acordo em fevereiro de 2022 por uma quantia não revelada, mas o processo criminal ainda corre. Isso significa que o príncipe não pode viajar aos EUA, onde não goza de qualquer privilégio. Corre risco de ser preso. Andrew foi excluído de todas as atividades da monarquia.
O príncipe Harry, filho mais moço de Charles e Diana, casou em 2018 com Meghan Markle, uma atriz norte-americana divorciada de origem africana. Em janeiro de 2020, o casal abandona todas as atividades ligadas à monarquia e se muda para os EUA, alegando perseguição dos tabloides e discriminação dentro da família real.
Durante a pandemia da covid-19, a rainha se isola no Castelo de Windsor e é forçada a ficar sozinha no funeral do marido, em 9 de abril de 2021, enquanto o primeiro-ministro Boris Johnson fazia festinhas na residência oficial e sede do governo na Downing Street.
FUTURO
Sua morte suscita mais uma vez dúvidas sobre o futuro da monarquia. Países como a Austrália, a Nova Zelândia e o Canadá não querem mais o monarca britânico como chefe de Estado. Em 1999, um referendo realizado na Austrália não aprovou a transformação do país em república porque previa a eleição indireta do presidente.
A saída do Reino Unido da União Europeia fortalece o movimento pela independência da Escócia, onde os nacionalistas querem realizar um novo plebiscito para não serem governados por conservadores ingleses. O Castelo de Balmoral, onde a rainha morreu, pode ficar em outro país.
O peso da monarquia também será reavaliado. A família, que os cidadãos chamam de “a firma” tem várias propriedades e negócios, mas recebe o equivalente a mais de R$ 500 milhões por ano do orçamento do Reino Unido. Os britânicos alegam que atrai turistas e custa menos do que a Presidência da França.
Com a crise econômica atual, inflação de 10,1% ao ano, podendo chegar a 18% em 2020, e o impacto da saída da UE, uma das decisões mais desastrosas de um país desenvolvido, o país terá de reduzir o orçamento e as ambições, com risco de ser reduzido à pequena Inglaterra, se a Escócia se tornar independente.
Elizabeth II, símbolo da estabilidade e da unidade nacional, está morta. Presidiu à dissolução do maior império que o mundo já viu, de 35,5 milhões de quilômetros quadrados em 1920, quatro vezes maior do que o Brasil.
Cabe ao rei Charles III e ao príncipe William preservar esta tradição milenar. O grande drama do rei é não decepcionar. A sombra e o fantasma hamletiano da mãe serão onipresentes. O desafio de Charles é não decepcionar. A sombra e o fantasma shakespeariano da mãe serão onipresentes. Veja mais no meu canal no YouTube. Meu comentário:
Um comentário:
Parabéns, Nelson, por seu trabalho preciso e muito bem contextualizado. Uma honra ter você no Quarentena News
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