terça-feira, 21 de fevereiro de 2006

Ataque ao Irã mataria milhares

Uma possível onda de bombardeios aéreos dos Estados Unidos ou de Israel para destruir o programa nuclear do Irã matará milhares de soldados e civis, deflagrando uma crise com conseqüências muito além do Oriente Médio, com alta imprevisível nos preços do petróleo, aumento do radicalismo dos fundamentalistas muçulmanos e da ameaça de terrorismo suicida.

Será muito difícil destruir todas as instalações nucleares iranianas. Mesmo que fosse possível, o conhecimento tecnológico seria preservado. A bomba nuclear iraniana seria adiada por alguns anos mas não eliminada totalmente. O ataque reforçaria o nacionalismo iraniano, dando mais ímpeto à retomada do programa nuclear.

A advertência está no relatório Irã: as conseqüências de uma guerra, elaborado pelo pesquisador britânico Paul Rogers para o Oxford Research Group, um instituto dedicado à solução pacífica de conflitos. É especialmente preocupante porque alguns analistas acreditam que o prazo para impedir que o Irã desenvolva a tecnologia para fabricar armas atômicas termina este ano.

Se os EUA ou Israel tentarem lançar uma série de “bombardeios cirúrgicos” de surpresa, os americanos usarão aviões estacionados em porta-aviões no Golfo Pérsico e grandes bombardeiros das bases na Grã-Bretanha e de outros países da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) que apóiem a operação. Seus alvos serão reatores de pesquisa em Teerã, a capital iraniana, as instalações nucleares de Isfahan, Natanz, Arak e Bushehr, e possivelmente centros de pesquisa de universidades do Irã.

O resultado de quatro a cinco dias de bombardeio seria a morte de milhares de soldados e de pelo menos centenas de civis iranianos, estima Rogers, que na introdução do relatório considera difícil uma saída pacífica para a crise: “Uma solução diplomática para as profundas diferenças entre Washington e Teerã ainda é possível, mas está ficando mais improvável.”

Rogers não faz previsão de data mas observa que a república islâmica e seu novo presidente, Mahmoud Ahmadinejad, não revelam a menor intenção de ceder em busca de um acordo. Ahmadinejad declarou que Israel deve ser varrido do mapa. Israel destruiu em 1981 a usina nuclear iraquiana de Osirak. Agora fortalece-se a proposta entre os falcões israelenses de repetir a operação. Mas os iranianos certamente aprenderam com a experiência do Iraque. Construíram instalações mais protegidas e mais produndas.

No primeiro estudo científico sobre as conseqüências de um bombardeio contra o programa nuclear do Irã, Rogers sugere que o objetivo seria atrasar o surgimento da bomba atômica iraniana em “pelo menos cinco anos”. Ele acredita que tanto os EUA quanto Israel têm capacidade para “danificar severamente os programas nucleares e de mísseis iranianos”. Mas alerta que “o Irã teria muitas maneiras de reagir nos meses e anos seguintes”. Por mais bem-sucedido que seja o ataque, aumentariam significativamente a instabilidade na região mais explosiva do mundo e o terrorismo internacional.

POSSÍVEIS RETALIAÇÕES
Além de usar o petróleo como arma econômica, o que ameaça fazer se for alvo de sanções imposta pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas, o Irã promete lançar uma onda de ataques terroristas suicidas contra alvos americanos em retaliação a um ataque. Pode acionar o Hesbolá (Partido de Deus), a milícia xiita libanesa que sustenta, para disparar mísseis contra o Norte de Israel, e o Movimento de Resistência Islâmica (Hamas), que acaba de vencer as eleições legislativas palestinas e está formando um governo, mas recusa-se a abandonar a luta armada e a reconhecer o Estado de Israel. Pode usar os insurgentes no Iraque para desestabilizar ainda mais o pais ocupado por americanos e bitânicos.

Com a vitória da aliança liberada pelos xiitas nas eleições para formar o primeiro governo iraquiano permanente desde a queda de Saddam Hussein, em abril de 2003, reforça-se a impressão de que até agora o Irã é o grande beneficiário da invasão do Iraque. O novo governo iraquiano ficaria ainda mais sitiado em caso de ataque ao Irã. A maioria xiita não aceitaria mais uma ação militar dos EUA no Oriente Médio.

Um ataque destruiria ainda qualquer possibilidade de negociação sobre o programa nuclear iraniano através das instituições multilaterais, como a ONU e sua Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), “minando os esforços globais pela não proliferação”, acrescenta o estudo. “Em vez de conviver com um Irã com potencial de produzir armas nucleares, a ação americana praticamente garantiria a emergência de um Irã armado de bombas atômicas ou exigiria novas ações militares”.

O sucesso dos bombardeios provocaria um longo conflito capaz de se expandir se outros países, além dos EUA e de Israel, não aceitarem um Irã nuclear ou se tentarem produzir a bomba para neutralizar uma possível ameaça iraniana.

Mais ainda: inflamaria o antiamericanismo no mundo muçulmano. Isto aprofundaria o radicalismo, beneficiando grupos terroristas como a rede Al Caeda e o recrutamento de homens-bomba. O ataque provocaria uma onda de terrorismo suicida, podendo provocar novas ações militares americanas ou israelenses, “estabelecendo um ciclo de violência extremamente perigoso”, analisa Rogers.

Apesar de todos estes riscos, o pesquisador considera elevada a possibilidade de um ataque porque não vê muitas chances de desarmar o conflito entre os EUA, Israel e o Irã: “É inaceitável para os EUA que um ‘país-pária’ como o Irã possa desenvolver sua capacidade nuclear. Isto limitaria grandemente as opções dos EUA na região e ameaçaria seu maior aliado – Israel”. Por sua vez, Israel “considera essencial para sua segurança ser o único pais do Oriente Médio com capacidade nuclear”. E o regime fundamentalista do Irã, cercado por países invadidos pelos EUA, o Iraque e o Afeganistão, deve ver na bomba a única garantia de sua segurança.

Nas suas conclusões, Rogers sustenta que a opção militar deve ser descartada, apesar das dificuldades com alternativas. Vale a pena ver suas previsões sobre a invasão do Iraque, feitas em novembro de 2002. Ele antecipou o “aumento da oposição regional à presença dos EUA” e do “apoio a organizações como Al Caeda, sendo contraprodutivo para a paz e a segurança no Oriente Médio”.

DOUTRINA BUSH EM QUEDA
A ameaça nuclear do Irã é concreta e perturbadora, ao contrário das supostas armas de destruição em massa de Saddam Hussein, citadas para justificar a invasão do Iraque mas jamais encontradas. O Irã tem um regime fundamentalista, apóia grupos terroristas como o Hesbolá e o Hamas, e deu asilo a membros d’al Caeda. Mas atinge o nível critico num momento em que a Doutrina Bush, de guerras preventivas, está em declínio por causa dos problemas da ocupação do Iraque e da ascensão dos fundamentalistas nas eleições encorajadas pelos EUA para democratizar o Oriente Médio como forma de combater o terrorismo.

Em 2002, a nova Doutrina de Segurança Nacional dos EUA afirmava que o país lançaria ataques preventivos contra países-párias e terroristas, sozinho se necessário. Esse pensamento estratégico, formulado pelos chamados neoconservadores como os na época subsecretário da Defesa, Paul Wolfowitz, o secretário adjunto Douglas Feith e o assessor do Pentágono para política de defesa, Richard Perle, orientou a invasão do Iraque, numa política externa ativista e ideológica.

Diante dos custos políticos, econômicos e militares da guerra, a política externa do segundo governo George Walker Bush volta para o âmbito do Departamento de Estado. A secretária de Estado, Condoleezza Rice, pediu US$ 85 milhões para promover a democracia no Irã. A diplomacia passa a ter mais peso do que o uso da força, embora este não possa ser descartado, sobretudo no caso iraniano.

É o retorno do “pragmatismo responsável”, como se definia a política externa americana sob o secretário de Estado Henry Kissinger, tão a gosto de setores mais isolacionistas do Partido Republicano, que entendem que os EUA não podem querer consertar os males do mundo, devendo se concentrar na defesa de seus interesses.

Para o pensador americano Francis Fukuyama, que lançou a tese do fim da História logo após o final da Guerra Fria, prevendo que a democracia liberal e a economia de mercado seriam os regimes político e econômico dominantes, “este esforço idealista de usar o poderio americano para promover a democracia e os direitos humanos pode sofrer sua maior derrota”. Com o avanço dos fundamentalistas, os republicanos mais pragmáticos já argumentam que Bush prejudicou os interesses americanos com sua política externa ativista, que alienou os tradicionais regimes autoritários aliados dos EUA no Oriente Médio.

Em artigo recente intitulado Depois do Neoconservadorismo, Fukuyama cita Walter Russel Mead para dizer que os conservadores que apóiam a guerra o fazem por acreditar que seus filhos estão lutando e morrendo no Oriente Médio para defender os EUA do terrorismo nuclear, não para promover a democracia. Não querem retirar o apoio ao presidente mas aumenta a porcentagem dos que entendem que os EUA “devem cuidar de si mesmos”, atingindo o maior índice desde o Vietnã, em outro sinal de que uma Síndrome do Iraque se abate sobre o invasor.

Fukuyama identifica nos neoconservadores uma crença de que “o poderio americano deve ser usado por razões morais” e “um ceticismo sobre a capacidade do direito e das instituições internacionais de resolver os problemas de segurança mais graves”. Por outro lado, cresce a convicção de que “programas de engenharia social ambiciosos freqüentemente levam a conseqüências inesperadas que minam seus objetivos”. É o risco associado a boas intenções levadas ao extremo.

Não é à toa que os neoconservadores são chamados de trotskistas de direita. Muitos foram trotskistas no início de sua vida. Foi o sucesso do presidente Ronald Reagan no final da Guerra Fria que empolgou os neocons. Depois de oito anos de governo do democrata Bill Clinton, eles voltaram com força total sob George Bush, filho, alegando que os EUA não haviam tirado todos os benefícios merecidos pela vitória sobre a União Soviética.

Os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001 abriram caminho para aplicação de sua agenda radical. Talvez embalados pelo avanço da democracia nas últimas três décadas, eles subestimaram os problemas que enfrentariam no pós-guerra no Iraque. Num livro recente sobre o Iraque, ‘O Portão dos Assassinos”, George Packer, afirma que o Pentágono esperar reduzir o total de soldados americanos no Iraque para 25 mil poucos meses depois da invasão.

DE VOLTA AO REALISMO
Em defesa deste maximalismo por meio do qual os EUA exerceriam uma “hegemonia benevolente”, Robert Kagan e William Kristol chegaram a afirmar que “é precisamente por que a política externa americana está embebida de um elevado e incomum grau de moralidade que outros países têm pouco a temer diante desta potência colossal”. Hoje estas palavras soam irônicas, diante da união do resto do mundo contra o unilateralismo de Bush.

A “hegemonia benevolente” é mais um mito alimentado pelo excepcionalismo americano, que vende a idéia de que os EUA são um país diferente e especial que luta pelo bem da humanidade. Isto justificaria as transgressões ao direito, tanto na invasão do Iraque quanto no uso de tortura, prisões ilegais, seqüestros e escuta telefônica de inocentes. Mas, comenta Fukuyama, a intervenção americana não foi nem benevolente nem competente, minando qualquer autoridade moral diante do resto do mundo.

Ao anunciar a morte do neoconservadorismo, Fukuyama afirma que os EUA precisam desmilitarizar a guerra contra o terrorismo, concentrando-se em operações policiais e de inteligência. A palavra guerra foi na sua opinião mal empregada. O combate ao terrorismo é mais uma luta por corações e mentes no mundo muçulmano. Como mostra a guerra das caricaturas do profeta Maomé, a Europa será um dos campos de batalha mais importantes.

Diante dos limites políticos, econômicos, diplomáticos e militares do intervencionismo americano, será preciso resgatar as instituições internacionais humilhadas quando Bush ignorou a recusa da ONU em autorizar a invasão do Iraque. Os EUA estão fazendo isto ao lidar com os dois outros integrantes do que Bush definiu em janeiro de 2002 como o eixo do mal: o Irã e a Coréia do Norte.

É a volta triunfante da diplomacia. O neoconservadorismo ficou associado à mudança de regime pela força, unilateralismo e hegemonia dos EUA. É o fim do “wilsonismo desbotado”, escreveu André Fontaine no jornal francês Le Monde, numa referência ao presidente Woodrow Wilson, que convenceu os americanos a saírem do isolamento e entrarem na Primeira Guerra Mundial com o argumento de que era “a guerra para acabar com todas as guerras e tornar o mundo seguro para a diplomacia”.

De volta ao realismo, o ex-subsecretário de Estado Thomas Pickering e o pesquisador John Newhouse, do World Security Institute, insistem em que a questão nuclear do Irã deve ser atacada num esforço conjunto das grandes potências, a começar pela China e a Rússia, que têm direito de veto no Conselho de Segurança.

Com seu consumo cada vez maior de energia importada, a China precisa de estabilidade no Oriente Médio. A Rússia, vizinha do Irã, não quer uma guerra americana no seu quintal. Já se ofereceu para enriquecer urânio para o programa nuclear iraniano para fins pacíficos. A Índia, aliada do Irã na época do domínio dos talebã sobre o Afeganistão, também pode ser acionada numa megaofensiva diplomática para moderar o regime dos aiatolás. A União Européia também tem interesse numa solução pacífica porque está no olho do furacão, como mostra a crise em torno das caricaturas de Maomé, e 5% dos seus 460 milhões de habitantes são muçulmanos.

A realidade é que os EUA não tem condições resolver unilateralmente nem a questão do Iraque nem a do Irã, admitem Pickering e Newhouse. Esta volta ao pragmatismo responsável é a maior esperança de que uma nova onda de bombardeios, desta vez contra um país governado por fundamentalistas, com 70 milhões de habitantes e uma longa tradição nacionalista antiocidental, não venha a inflamar ainda mais a já explosiva situação do Oriente Médio.

3 comentários:

otavio disse...

Caro Jobim, percebe-se claramente que você é contra este provavel ataque ao Iran, mas não se esqueça que o Iran frequentemente diz que irá varrer Israel do mapa. Imagine se a Argentina fizesse o mesmo com o Brasil. Quanto aos seus comentários sobre as consequências, creio que existe muitas variáveis imprevisíveis e, como sempre acontece, as previsões nunca chegam perto da realidade dos fatos.

Anônimo disse...

Israel deve ser varrido sim ... Todas as guerras praticamente começam por causa do povo prometido , povo esse que deveria dar exemplo de amor , união e respeito ao proximo , as dominaç~eos dos Judeus não passam desapercebidas para a maioria das pessoas , gostam de jogar contra todas as nações do mundo , essa é a hora de mudarem isso , chega de dominação judaica , está na hora de uma nova era , um novo conceito e um novo mundo ......

Nelson Franco Jobim disse...

Sua pregação é genocida e baseada num pensamento paranoico.