quarta-feira, 8 de fevereiro de 2023

Biden destaca melhora na economia e pede trégua à oposição

Presidente dos Estados Unidos falou como candidato à reeleição 

Ao prestar contas ao Congresso no seu segundo Discurso sobre o Estado da União, o presidente Joe Biden chamou a atenção para a recuperação da economia, com o ganho de 517 mil vagas de emprego criadas no mês passado, 12 milhões desde o início do governo, e a queda no desemprego para 3,4%, o menor desde 1959, e pediu à oposição, que agora tem maioria na Câmara dos Representantes, que trabalhe com o governo como fez nos últimos dois anos e não faça obstrução sistemática às ações do Executiva.

Em uma hora e 13 minutos, Biden se concentrou nas questões internas. Só dedicou cinco minutos a questões internacionais, quando acusou o ditador russo Vladimir Putin pela invasão da Ucrânia e propôs competição sem conflito a China, mas advertiu que os Estados Unidos estarão atentos e tomarão medidas contra qualquer ameaça, sem citar o balão-espião chinês abatido pela Força Aérea. 

O aquecimento global foi citado brevemente para dizer que "fizemos o maior investimento para controlar a mudança do clima". Cuba, Nicarágua, Venezuela e Haiti foram mencionados por causa da imigração, uma questão doméstica.

Como todos os presidentes nas últimas três décadas, Joe Biden afirmou que o Estado da União é forte. Mas o que está em jogo é o estado de sua reeleição. Durante a campanha, Biden prometeu não se recandidatar. Mudou de ideia e repetiu várias vezes a frase: "Temos de terminar o trabalho."

Só três presidentes no pós-guerra tinham avaliação pior do que Biden nesta altura do mandato. Dois – Jimmy Carter e Donald Trump – não se reelegeram. Ronald Reagan deu a volta por cima. Em estados-chaves para vitória em 2024, dois terços do eleitorado não querem a reeleição. Pesquisas recentes indicam que nem mesmo a maioria dos democratas querem mais quatro anos para Biden na Casa Branca. 

A aprovação do presidente está abaixo de 50% desde agosto de 2021, antes do discurso em 42%. Biden tentou nesta noite vender suas conquistas. Só 36% dos norte-americanos veem avanços importantes no governo atual. Entre os independentes, que decidem as eleições, dois terços entendem que Biden fez muito pouco ou praticamente nada. 

Em sua estratégia de convencer pelo menos parte do Partido Republicano a trabalhar com o Executivo, Biden cumprimentou o novo presidente da Câmara, deputado Kevin McCarthy, e fez uma piada: “Não quero arruinar sua reputação, mas quero trabalhar com você.” 

Também saudou o líder do Partido Democrata na Câmara, Hakeem Jeffries, o primeiro afro-americano líder de um partido no Congresso, o líder republicano no Senado, Mitch McConnell, o líder democrata no Senado, Chuck Schumer, e a ex-presidente da Câmara, Nanci Pelosi.

Biden citou "o progresso e a resiliência" como as grandes características do país, "sempre indo à frente sem nunca desistir". Falou nos 12 milhões de novos empregos "por causa de vocês". Muitos representam a recuperação pós-pandemia.

"Dois anos atrás, a covid fechou lojas, empresas e escolas. Hoje a covid não domina mais nossas vidas e a democracia está firme e forte. Estamos redigindo um novo capítulo numa história de possibilidades. Nos últimos dois anos, mostramos que democratas e republicanos podem trabalhar juntos, construindo pontes, recuperando a infraestrutura. Sancionei 300 projetos bipartidários. Se trabalhamos juntos no Congresso passado, não há razão para não fazer o mesmo no atual Congresso", reforçando a mensagem de combater a polarização política.

Dentro do xadrez político norte-americano, Biden tentou seduzir parte da oposição republicana, que tende a complicar sua vida. Mas o público-alvo maior é o eleitorado, que está farto da guerra política e quer soluções práticas. Biden falou principalmente para o eleitorado branco sem curso superior, tradicionalmente a favor do Partido Democrata, que foi conquistado pelo nacionalismo econômico do presidente Donald Trump (2017-21).

Quando falou das cidades desindustrializadas e da "perda de orgulho" da classe média norte-americana, Biden citou o pai, que dizia: "Um emprego é muito mais do que um cheque no fim do mês." É motivo de segurança e autoconfiança. O desemprego de negros e latinos é o menor da história.

O sonho de Biden é que "os EUA podem liderar a produção industrial do mundo". A maioria dos economistas duvida, por causa dos custos de produção. "A inflação é um fenômeno global por causa da pandemia e da agressão de Putin na Ucrânia. A inflação está caindo há seis meses. Nos últimos dois anos, 10 milhões de norte-americanos abriram novas empresas. Cada vez que alguém cria uma empresa é uma esperança", congratulou-se Biden. 

Se não lançou a candidatura, Biden usou um tom de campanha. "Os chips [de computador] foram inventados nos EUA. Fazíamos 40%; hoje, fazemos 10%. Hoje os automóveis têm 3 mil chips. E agora os EUA não conseguem fabricar automóveis por falta de chips", o que aconteceu durante a pandemia. 

"Isto não pode se repetir", acrescentou o presidente reforçando o caráter nacionalista e protecionista da política econômica. "As cadeias de suprimento para os EUA devem começar nos EUA. Esperamos US$ 300 bilhões de investimento na indústria nos próximos anos. Precisamos da melhor infraestrutura do mundo. Éramos número um, hoje somos 13º. Estamos fazendo o maior investimento em infraestrutura desde que o presidente Dwight Eisenhower construiu as autoestradas" para que os mísseis nucleares pudessem trafegar em alta velocidade. (...) Vamos instalar Internet de alta velocidade. E estamos apenas começando. E tudo o que precisamos para obras de infraestrutura será feito com produtos norte-americanos."  

Outro tema foi os preços dos medicamentos nos EUA, os mais caros do mundo. "Big Pharma cobra US$ 45 por mês por insulina, que custa US$ 10 para produzir. Baixamos para US$ 35." Biden prometeu vetar medidas que aumentem o preço dos medicamentos. Como o Partido Republicano é mais ligado ao grande capital, era um recado para a oposição.

A desigualdade exige a mudança no sistema de impostos, que não é justo, criticou Biden: "Sou capitalista, mas cada um tem de pagar sua parte. Empresas que ganham US$ 40 bilhões não pagam impostos federais. Empresas que ganham mais de US$ 1 bilhão tem de pagar pelo menos 15% de imposto de renda. Nenhum bilionário deve pagar numa alíquota menor do que uma professora ou um bombeiro."

As empresas de petróleo, que ganharam US$ 200 bilhões com a guerra e a alta nos preços, e nem investiram na produção local, pode ser alvo de um imposto especial.

Os republicanos reagiram ruidosamente quando o presidente falou num projeto da oposição para cortar o financiamento da seguridade social e do Medicare, o programa de saúde para os idosos. A extremista Marjorie Taylor Greene o chamou de "mentiroso". Biden pede trégua à oposição, mas mina sua proposta econômica.

"Então, Medicare está seguro. Quero cortar o déficit mais US$ 2 trilhões sem cortar na saúde nem na seguridade social", alegou Biden. Também falou em direitos do consumidor diante de companhias aéreas, de oferecer assistência de saúde em casa para idosos, moradia acessível, aumento para os professores, dignidade para os trabalhadores, combate ao fentanil, a droga que mata 70 mil norte-americanos por ano, a proibição de armas de guerra, reforma da imigração, reforma das políciais, Lei de Igualdade para a comunidade LGBTQIAP+ e em manter o cuidado com a covid, embora vá suspender em breve a emergência de saúde pública.

Foi aplaudido ao prometer vetar qualquer projeto para proibir o aborto em lei federal.

O mundo ficou para o fim: "A invasão de Putin é um teste para os EUA e o mundo. No ano passado, disse aqui: vamos nos erguer para defender a democracia. Um ano depois, temos a resposta. Nós conseguimos. Criamos uma coalizão global, apoiamos a Ucrânia. Vamos ficar com vocês o tempo que for necessário. Antes de eu chegar ao poder, a China estava crescendo e os EUA diminuindo. Vamos investir em inovações para liderar em áreas em que a China pretende ser dominante. Estamos na melhor posição para competir. Estou pronto para competir com a China, mas não se enganem", numa referência indireta ao episódio do balão. 

No fim Biden, anunciou um plano para reduzir as mortes de câncer em 50% nos próximos 25 anos, "uma prova de que ainda podemos fazer grandes coisas." Ele lembrou o programa do governo George W. Bush no combate à aids, especialmente na África. 

"O que nos permite fazer tudo isso é nossa democracia", atacando o extremismo e o golpismo de Trump, que tem vários adeptos no Congresso. "Nos últimos anos, nossa democracia foi atacada em 6 de janeiro de 2021. Não há lugar para violência política nos EUA. A democracia não é uma questão partidária. Estamos num momento crucial que vai decidir o curso desta nação nas próximas décadas. Precisamos nos ver como companheiros. Somos a única nação criada em torno de uma ideia. (...) Porque a alma desta nação é forte...o Estado da União é forte. Nunca fui tão otimista. Só precisamos nos lembrar quem somos, os EUA."

Foi um discurso de candidato. Resta anunciar oficialmente a disputa pela reeleição, o que o presidente promete fazer ainda neste mês. Como o ex-presidente Trump lançou sua candidatura, há o risco de uma repetição da eleição presidencial de 2020. Não é o que eleitorado quer, um presidente octagenário e um ex-presidente com quase 80 anos concorrendo à Casa Branca. Mas Biden apresentou suas realizações.

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