segunda-feira, 8 de abril de 2013

Ex-primeira-ministra Margaret Thatcher morre aos 87 anos

A ex-primeira-ministra britânica Margaret Thatcher (1979-90) morreu hoje aos 87 anos em Londres de um acidente vascular cerebral. Mais importante chefe de governo do Reino Unido desde Winston Churchill, ela se aliou ao presidente americano Ronald Reagan para promover uma contrarrevolução conservadora na última década da Guerra Fria.

"Foi a maior líder britânica em tempos de paz", declarou o primeiro-ministro conservador David Cameron. Em Washington, o presidente Barack Obama comentou que o mundo perdeu "uma grande defensora da liberdade, e uma grande amiga dos Estados Unidos", reporta a televisão pública britânica BBC.

Margaret Hilda Thatcher foi a primeira mulher a se tornar primeira-ministra britânica e a pessoa que chefiou o governo do país por mais tempo no século 20. Ela chegou ao poder em maio de 1979, depois do chamado Inverno do Descontentamento, marcado por uma série de greves, agitação social e desemprego resultantes da primeira crise do petróleo.

Dama de Ferro, apelido que ganhou da imprensa soviética em 1976 depois de um discurso anticomunista quando era líder da oposição, prometia resgatar a moralidade pública e reduzir a participação do Estado na economia.

Além de cortar impostos, uma de suas principais bandeiras foi a privatização de empresas estatais, que ela considerava mais ineficientes do que o setor privado. Thatcher queria transformar a Grã-Bretanha num país de acionistas. Começou esse processo em 1981 sob forte oposição dos sindicados, ligados ao Partido Trabalhista.

Estavam lançadas as bases do thatcherismo, que incluíam recuo da máquina estatal, disciplina fiscal, cortes de impostos, privatizações, respeito à autoridade e à ordem pública, e um feroz anticomunismo. Poucos primeiros-ministros dão nome a uma filosofia política.

Em seu radicalismo, Margaret Thatcher chegou a dizer: "Não existe isso que chamam de sociedade. Há homens, mulheres e famílias".

O total de desempregados no Reino Unido subiu para 3 milhões, e o número de pobres aumentou quatro vezes, aprofundando a desigualdade social, uma das marcas perversas do neoconservadorismo. Impopular, Thatcher contou com uma ajuda inesperada.

A invasão das Ilhas Malvinas pela ditadura militar da Argentina em 2 de abril de 1982 foi um teste decisivo para sua determinação. Uma força-tarefa foi deslocada para a guerra a 10 mil quilômetros de distância da Inglaterra. Em 14 de junho, as ilhas foram retomadas depois da morte de 649 argentinos e 258 britânicos.

Humilhada, a ditadura militar argentina caiu. Fortalecida, Thatcher obteve sua maior vitória eleitoral em 1983. Com maioria de 144 deputados no Parlamento Britânico, partiu para o enfrentamento com os sindicatos para impor sua ideologia econômica neoliberal. Uma greve de 11 meses contra o fechamento de 20 minas estatais deficitárias deixou o Reino Unido sem carvão em 1984 e 1985.

Sem o apoio da opinião pública, a greve fracassou. Os mineiros e o sindicalismo em geral perderam força.

Também em 1984, Margaret Thatcher sobreviveu a um atentado a bomba do Exército Republicano Irlandês (IRA) contra a convenção anual do Partido Conservador. Foi uma tentativa de vingar as mortes de militantes republicanos irlandeses em greve fome que exigiam reconhecimento como presos políticos, em 1981. Inflexível, a Dama de Ferro os considerava criminosos comuns.

No mesmo ano, Thatcher convidou o futuro líder soviético Mikhail Gorbachev para ir a Londres. Foi a primeira a identificá-lo no Ocidente como "alguém com quem se pode negociar".

Naquela época, ela considerava o líder negro sul-africano Nelson Mandela, que ainda estava preso, como "terrorista". Mais tarde, viria a defender o amigo e admirador general Augusto Pinochet, o ditador   preso em Londres por crimes cometidos quando governou o Chile, de 1973 a 1990.

Sob Thatcher, amplos setores da economia britânica, aviação, metalurgia, telecomunicações, água, energia e o sistema ferroviário, foram entregues à iniciativa privada. Foram mudanças permanentes, observa o jornal The New York Times. Modernizaram a Grã-Bretanha, mas aprofundaram a desigualdade.

A ex-primeira-ministra também foi uma grande adversária do aumento dos poderes da Comunidade Europeia, hoje União Europeia. Chegou a bater na mesa com sua bolsa para pedir a devolução de parte da contribuição britânica para a política comum de subsídios agrícolas do bloco europeu, já que o Reino Unido tem uma agricultura muito menor do que países como a França e a Alemanha.

"Não estou pedindo o dinheiro dos outros. Estou pedindo nosso dinheiro de volta", afirmou.

Em 1987, depois de sua terceira vitória eleitoral consecutiva, Thatcher se tornou ainda mais antieuropeia, preocupando um de seus maiores aliados, o centro financeiro de Londres, que temia perder a primazia para Paris ou Frankfurt na união monetária europeia porque o Reino Unido não adotaria o euro.

Uma de suas principais bandeiras, entusiasticamente adotada pelo Partido Conservador, foi repatriar poderes da UE para o Parlamento Britânico. Diante do avanço do euroceticismo e da crise da Zona do Euro, o atual primeiro-ministro e líder do partido, David Cameron, prometeu convocar um plebiscito sobre a permanência do país na UE até 2017.

O risco de isolamento na Europa e a substituição do imposto predial e territorial por um imposto por pessoa, independentemente da renda pessoal e do tamanho da propriedade, selou sua impopularidade. Em novembro de 1990, o ex-ministro Michel Heseltine, um europeísta, desafiou a liderança da Margaret Thacher.

Sem conseguir uma vitória consistente, com mais de dois terços dos votos da bancada do partido na Câmara dos Comuns, Thatcher pediu demissão. Virou Baronesa Thatcher e foi para a Câmara dos Lordes. Enquanto sua saúde permitiu, influenciou a vida política do país.

O regicídio, como o episódio é conhecido na Grã-Bretanha, abriu uma guerra interna de que o Partido Conservador não se recuperou até hoje. O compromisso com a defesa de Londres como um dos maiores centros financeiros do mundo entra em choque com a rejeição à integração europeia.

Talvez seu maior legado tenha sido a profunda reforma política e econômica, que foi muito além do Reino Unido. Antes de Thatcher, a maioria das companhias aéreas e as empresas telefônicas de fora dos EUA eram estatais.

Para voltar ao poder com Tony Blair, em 1997, o Partido Trabalhista fez uma ampla mudança, abrindo mão do socialismo e da estatização dos meios de produção, que foram excluídos do programa partidário para reconquistar a classe média. Essa foi a grande vitória ideológica de Thatcher, fazer o principal adversário abraçar a economia de mercado.

Do ponto de vista econômico, o neoliberalismo que defendeu com tanto vigor ao lado de Reagan foi a ideologia dominante da economia internacional por quase três décadas. Com suas políticas de desregulamentação e redução da atividade do Estado, foi a principal causa da grande crise econômico-financeira internacional de 2008-9, que ainda não terminou.

Acima de tudo, Thatcher ajudou a acabar com a Guerra Fria, resgatou o prestígio da economia de mercado e recuperou o orgulho do Reino Unido, mas a um custo social elevado que dividiu o país, aumentou a desigualdade social e o afastou do resto da Europa.

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