segunda-feira, 1 de janeiro de 2007

Venezuela de Chávez mergulha na corrupção

A falta de controle sobre o orçamento público, a existência de orçamentos públicos paralelos, as malas de petrodólares e a obscuridade até mesmo das contas do Banco Central tornam a Venezuela o segundo país mais corrupto da América Latina, depois do Haiti, na avaliação da organização não-governamental de combate à corrupção Transparência Internacional (TI).

Na Venezuela, constata reportagem do jornal francês Le Monde, economia informal não significa apenas uma relação de trabalho precária, camelotagem ou microempresas que não se registram para não pagar impostos. Nos últimos quatro anos, Chávez multiplicou os orçamentos paralelos que se nutrem dos petrodólares da companhia estatal Petroleos de Venezuela (PdVSA), que financiou até a escola campeã do carnaval carioca do ano passado.

"O Fonden (Fundo de Desenvolvimento Nacional) é um objeto financeiro não-identificado, um OFNI, um cofre enorme cujo uso depende exclusivamente do presidente e do ministro das Finanças", observa um diplomata estrangeiro.

De um orçamento público nacional de cerca de US$ 60 bilhões, o Fonden e outros fundos semelhantes ficam com US$ 22 bilhões, admite o ministro das Finanças, Nelson Merentes.

"O Fonden não tem regras conhecidas nem a obrigação de publicar balanços", assinala o economista Fernando Vivancos. "Isso provoca corrupção". Os pagamentos de diversos programas sociais são feitos em espécie, com dinheiro vivo.

Para o jornalista Eleazar Diaz Rangel, diretor do jornal Ultimas Noticias, que apóia Chávez, "um organismo como o Fonden estimula a corrupção".

Quando Chávez chegou ao poder, em 1999, "a Venezuela estava entre os países mais corruptos da América Latina, ao nível do Paraguai, da Nicarágua e do Paraguai", afirma Mercedes de Freitas, diretora da Transparência na Venezuela. "Agora, a barômetro da corrupção da TI a coloca abaixo apenas do Haiti".

"A corrupção atingiu níveis sem precedentes", declara ao Monde o ex-deputado Felipe Mujica, do Movimento ao Socialismo (MAS), que apoiou Chávez na primeira eleição, em 1998. "O favoritismo generalizado e o enriquecimento dos altos funcionários criou uma nova elite chavista. A corrupção vem da maneira de governar de Chávez. A execução do orçamento e a administração não são controlados. Ele dispõe de maneira discricionária dos recursos da PdVSA, que transformou na sua caixa preta. As reservas do Banco Central foram arbitrariamente limitadas a US$ 30 bilhões. O excedente, de US$ 7 bilhões a US$ 10 bilhões, foi colocado à disposição do presidente".

Neste ambiente rico em petrodólares sem controles nem oposição parlamentar - os aliados do presidente conquistaram todas as cadeiras da Assembléia Nacional nas eleições de 2005, boicotadas pela oposição -, os gastos públicos batem recordes, assim como a importação de bens de consumo de luxo.

Como piada, fala-se em Caracas na construção de um 'uisqueduto' para facilitar as importações da bebida da Escócia, ironizando a proposta chavista de fazer um gasoduto de US$ 30 bilhões ligando Venezuela-Brasil-Argentina.

"A corrupção era endêmica antes de Chávez", reconhece o ex-guerrilheiro e ex-ministro Teodoro Petkoff, hoje diretor do jornal de oposição Tal Cual. "A Venezuela é um petro-estado como a Nigéria ou a Arábia Saudita. Mas Chávez duplicou o número de ministérios, que seguido se superpõe, e multiplicou o número de órgãos públicos fora de qualquer controle. O orçamento dos programas sociais e opaco e sua execução clientelista".

Na opinião do Monde, a corrupção atinge todos escalões da máquina do Estado e todos os setores da sociedade venezuelana. Tirar um passaporte em 24 horas pode custar US$ 300 de propina. Os subornos pagos por debaixo da mesa são chamados de "sobrepreço".

Mercedes de Freitas, diretora da Transparência, ressalva que "a corrupção um traço congênito dos venezuelanos. O problema é a fraqueza das instituições. Cooperamos na prevenção com prefeituras de todas as tendências políticas. Acima delas, as portas estão fechadas. Apenas 15% dos contratos públicos são registrados. Entre eles, 95% são feitos sem licitação, sob o pretexto de urgência. As possibilidades de concussão [extorsão ou peculado cometido por funcionários público no exercício de sua função] se multiplicam."

Este mar de lama atinge diretamente a PdVSA. Pela primeira vez desde a nacionalização do petróleo em 1976, a estatal não divulga seus resultados nem balanços trimestrais, semestrais e anuais. O ministro da Energia, Rafael Ramírez, um chavista, acumula a presidência da PdVSA, que perdeu toda a autonomia depois de desafiar Chávez com uma greve no final de 2002 e início de 2003.

O vice-presidente José Vicente Rangel, outro ex-guerrilheiro, alega que "a corrupção começou com Colombo. Nunca foi tão combatida quanto hoje", afirmou, chamando as denúncias de "fogos de artifício da oposição": "Como o candidato da oposição, Manuel Rosales, governador do estado de Zulia, enriqueceu? Por que ninguém fala da corrupção no setor privado? Há muita hipocrisia nas denúncias da imprensa."

"Atacar a reputação de funcionários" pode dar até três anos de cadeia. A jornalista Ibeyise Pacheco foi condenada a nove meses por difamar um coronel. Mas, conclui Le Monde, ninguém foi condenado pela campanha anticorrupção prometida por Chávez.

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