segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Globalização recua com a crise no Ocidente

Diante da aprovação da saída do Reino Unido na União Europeia no plebiscito de 23 de junho de 2016 e da vitória do nacionalismo de Donald Trump na eleição presidencial nos Estados Unidos, fica evidente a reação negativa das classes média e baixa com as perdas sofridas pelo processo de globalização econômica.

Enquanto a renda dos ricos que vendem para o mercado mundial cresce exponencialmente, a renda dos trabalhadores não registra aumentos significativos há décadas nos países ocidentais, fomentando reações nacionalistas e protecionistas que ameaçam a ordem internacional liberal construída sob a liderança dos EUA desde o fim da Segunda Guerra Mundial.

Desde a Grande Recessão, o crescimento do comércio internacional caiu sensivelmente. O valor das transações de bens e serviços subiu cerca de 60% de 2005 a 2015, mas sofreu uma forte queda no ano passado, depois de avanços medíocres de 2011, quando se agrava a crise da UE, a 2014, indicam dados da OMC (Organização Mundial do Comércio).

A principal causa da queda no ano passado foi a redução de 45% nos preços de energia. O comércio exterior sofreu uma baixa de quase 20% em 2009, no auge da crise econômica e financeira internacional. Recuperou-se nos anos seguintes, com avanços de 20% em 2010 e de mais de 15% em 2011. Ficou praticamente estagnado em 2012 e cresceu em média 2,2% em 2013 e 2014.

No ano passado, o valor das exportações caiu em mais de 10% e as importações um pouco abaixo disso.

A América do Norte, a Ásia e a Europa foram responsáveis por mais de 88% do comércio de bens entre os agora 164 países-membros da OMC nos últimos dez anos. As dez maiores potências comerciais são responsáveis por 52% do comércio internacional.

Mesmo assim, a participação dos países em desenvolvimento subiu de 33% em 2005 para 42% em 2015. O comércio entre países em desenvolvimento passou de 41% para 52% de seu comércio total. E a participação das economias em desenvolvimento chegou a 42% do comércio internacional de bens em 2015.

No setor de serviços, as dez maiores potências fizeram 53% das transações internacionais e os países em desenvolvimento 36%. A exportação de serviços somou US$ 4,68 trilhões em 2015.

Por ironia da história, com o sucesso da campanha nacionalista e protecionista do presidente eleito Donald Trump nos EUA, coube ao líder da China comunista, Xi Jinping, a defesa do livre comércio durante a reunião de cúpula anual do fórum Cooperação Econômica da Ásia e do Pacífico (APEC), realizada no fim de semana em Lima, no Peru.

As reuniões de cúpula da APEC começaram no governo Bill Clinton, em 1993, marcando uma virada dos EUA para o Oceano Pacífico, onde estão hoje as economias mais dinâmicas do mundo. O presidente Barack Obama tentou institucionalizar as regras do comércio na região com a Parceria Transpacífica (TTP). Diante da rejeição de Trump, o atual governo parou o processo de ratificação no Congresso dos EUA.

Trump promete renegociar os acordos comerciais dos EUA, que considera lesivos, e ameaça impor tarifas pesadas às importações da China, responsáveis pela maior parte do déficit comercial americano, que no ano passado foi de US$ 532 bilhões. Corre o risco de deflagrar uma guerra comercial de consequências negativas e imprevisíveis.

O presidente eleito ignora as lições da história. Ao mesmo tempo, a integração europeia, um projeto para suplantar os nacionalismos culpados por duas guerras mundiais, um modelo para uma globalização social-democrata em que os ricos financiem o desenvolvimento das regiões mais pobres, enfrenta sua pior crise.

No fim da Segunda Guerra Mundial, o presidente Franklin Delano Roosevelt lançou as bases da ordem internacional econômica liberal do pós-guerra na Conferência de Bretton Woods, em 1944, criando o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Mundial e o sistema multilateral de comércio.

Roosevelt sabia que o esforço de guerra havia sido decisivo para acabar com a Grande Depressão (1929-39), a maior crise da história do capitalismo. Temia a volta da depressão e conflitos comerciais capazes de deflagrar uma nova guerra mundial.

Assim, o FMI socorreria países em dificuldades com o balanço de pagamentos para que não abandonassem o comércio internacional. O Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento, hoje mais conhecido como Banco Mundial, financiou a recuperação no pós-guerra e depois passou a financiar o desenvolvimento.

A globalização não vai acabar porque é consequência do desenvolvimento das tecnologias de comunicações e de transportes. Só pode ser destruída por uma guerra nuclear de grandes proporções. Na era da Internet, o mundo está cada vez mais conectado.

Mas a volta do nacionalismo nos EUA de Trump, na China de Xi, na Rússia de Vladimir Putin, na Índia de Narendra Modi, no Reino Unido de saída da UE e a ascensão da extrema direita na Europa criam um mundo menos solidário, mais instável e perigoso.

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