domingo, 1 de março de 2015

Francês escreveu Guanabara pela primeira vez

Nestes 450 anos da fundação da cidade do Rio de Janeiro pelos portugueses, uma lembrança dos relatos dos franceses, os primeiros europeus a tentarem se estabelecer nestas terras, em 10 de novembro de 1555, quase dez anos antes da data festejada hoje.

Jean de Léry, autor de Viagem à Terra do Brasil, foi um voluntário calvinista que veio atrás do invasor francês Nicolau Durand de Villegagnon na expectativa de criar no Novo Mundo uma sociedade baseada nos princípios da Reforma Protestante pregados em Genebra por João Calvino.

Depois de dois meses vivendo entre os índios tupinambás, Léry foi expulso por Villegagnon. Ele publico o livro em 1577, como uma resposta ao católico André Thevet, que culpou os protestantes pela derrota final da França Antártica, em 20 de janeiro de 1567. Quando estava aqui, datava sua cartas da Rivière de Goanabara.

É uma palavra tupi-guarani composta por gua + nã + bará. Signifca baía semelhante a um mar. Em O Tupi na Geografia Nacional (Salvador, 1928), Sampaio observa: "Confundiam os tupis muitas vezes a barra ou a foz de um grande rio com a barra ou entrada de um golfo ou baía, denominando-a pará e mbará ou bará quando precedida de som nasal. Os portugueses e seus navegadores do século 16 assim também o faziam (...). Léry foi o primeiro que nos transmitiu essa denominação dada do lugar pelos tupis, e que hoje erroneamente se pronuncia com o acento tônico na penúltima sílaba."

A "descrição do Rio Guanabara, também denominado Janeiro", está no capítulo 7 do livro sobre a viagem de Léry: "Este braço de mar e rio Guanabara, assim denominado pelos selvagens e pelos portugueses que alegam tê-lo descoberto no 1º dia do ano, também chamado de Janeiro, fica a 23 graus além da linha equinocial, sob o Trópico de Capricórnio. Sendo um dos portos de mar mais frequentado pelos franceses, julgo de interesse fazer uma descrição sumária.

"Sem me referir aos que outros já escreveram, começarei por dizer que penetra no interior das terras umas 12 léguas, com sete e oito de largura em alguns lugares. E embora sejam menos altas do que as que cercam o lago de Genebra, as montanhas que o rodeiam tornam os dois sítios muito semelhantes.

"Quem deixa o mar alto é forçado a costear três pequenas ilhas desertas [Tucinha, Pai e Taipu] contras as quais os navios mal pilotados correm grande risco de bater e despedaçar-se, porquanto a embocadura é muito difícil. Faz-se mister, em seguida, transpor um estreito que não chega a ter um quarto de légua de largura, e é limitado à esquerda or um rochedo em forma de pirâmide, não somente de grande altura mas ainda maravilhoso por parecer artificial. E por ser redondo como uma torre imensa, os franceses o chamaram hiperbolicamente de pot-au-beurre [pote de manteiga; é o Pão de Açúcar].

"Pouco adiante na subida do rio, há um rochedo raso, de 100 a 120 passos de circunferência, que denominamos Ratier [poderia ser a Ilha dos Ratos, hoje Ilha Fiscal]. Na sua chegada, depois de desembarcar alfaias e artilharia, Villegagnon pensou em construir ali uma fortificação, mas a maré o expulsou.

"Uma légua mais adiante encontra-se a ilha nos instalamos, que era desabitada antes de Villegagnon chegar ao país. Com meia milha de circunferência e seis vezes mais comprida do que larga, é rodeada de pedras à flor da água, o que impede que se aproximem os navios mais perto que à distância de um tiro de canhão e a torna naturalmente fortificada.

"Com efeito, ninguém pode ali atracar, nem mesmo em pequenos barcos, a não ser pelo do porto, situado em posição oposta ao mar alto. Bem guarnecida, não seria possível forçá-la nem surpreendê-la, como depois de nosso regresso os portugueses o fizeram por culpa dos que ficaram lá.

"Além do mais, nas extremidades desta ilha, existem dois morros nos quais Villegagnon mandou construir duas casinhas, edificando a sua, em que residiu, no centro da ilha, sobre uma pedra de 50 a 60 pés de altura [15 a 20 metros].

"De ambos os lados desse rochedo, aplainamos e preparamos pequenos espaços onde se construíram não só a sala onde nos reuníamos para a prédica e a refeição, mas ainda vários outros abrigos em que se acomodavam cerca de 80 pessoas, inclusive a comitiva de Villegagnon.

"Entretanto, a não ser a casa situada no rochedo, construída em madeira, e alguns baluartes para a artilharia revestidos de alvenaria, o resto não passava de casebres de pau tosco e palha construídos à moda dos selvagens, que de fato os fizeram."

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