terça-feira, 30 de outubro de 2012

Sandy é consequência do aquecimento global

Com 1,6 mil quilômetros de diâmetro, Sandy é o maior furacão já registrado no Oceano Atlântico, uma megatempestade formada pela água cada vez mais quente na região do Mar do Caribe que não se dispersou por causa de uma zona de alta pressão criada por uma massa de ar frio polar. Já matou pelo menos 10 pessoas nos EUA, três no Canadá e 67 nos países caribenhos (Cuba, Haiti e Jamaica).

Sandy é um exemplo dos fenômenos climáticos maiores e mais violentos provocados pela mudança do clima devida ao aquecimento global. O encontro de uma grande massa de ar quente com uma grande massa de ar frio tornou-o mais radical.

O clima da Terra sempre variou. O último período glacial durou 1 milhão de anos e terminou há 25 mil anos. A espécie humana e seus antepassados estão por aqui há 7 milhões de anos, então suportaram fortes variações de temperatura e climas hostis. Mas a civilização surgiu e se desenvolveu neste meio ambiente benigno do período Holoceno ou Recente.

Quando se fala do aquecimento global como problema ambiental, a questão é se o planeta está esquentando pela ação do homem. E os céticos que rejeitam essa tese alegam que os fenômenos da natureza são muito maiores do que a humanidade. A atividade humana não seria responsável pelo agravamento do efeito estufa.

Os gases que formam a atmosfera da Terra retêm parte do calor irradiado pelo Sol, criando uma estufa. Isso deixou a temperatura média do planeta em 16 graus centígrados. Sem o efeito estufa, a temperatura média seria de -18ºC (GRIBBEN, 1998), possivelmente incapaz de sustentar a vida na escala atual.

O problema ambiental é o agravamento do efeito estufa. Esta é a principal questão ecológica hoje porque envolve o mundo inteiro e exige uma solução global que está muito distante.

Hoje o mundo se divide em 194 países ou estados nacionais, cada um com seus próprios interesses, da gigantesca China, segundo maior país do mundo, com a maior população, segunda maior economia do mundo e hoje o maior poluidor, a algumas ilhas ameaçadas pela elevação do nível dos mares.

Um dos riscos é o degelo das calotas polares, que por sua vez geraria mais dióxido de carbono e metano, alimentando o processo de aquecimento global.

No século passado, o nível dos mares subiu entre 10 e 20 centímetros, dependendo da região. Neste século, pode subir de 30cm até um metro, o suficiente para fazer causar grandes estragos para as populações litorâneas. Mas, se todo o gelo da Antártida derreter, a alta pode chegar a quatro metros.

Só no Brasil, o prejuízo pode chegar a R$ 200 bilhões, alerta o prof. Paulo Rosman, da Coordenação de Programas de Pós-Graduação em Engenharia (Coppe) da UFRJ, citado por TRIGUEIRO em Mundo Sustentável 2 (S. Paulo: Globo, 2012, p. 317-345), sem falar nos danos à agricultura e à geração de energia hidrelétrica.

ANTECEDENTES HISTÓRICOS
Já no ano de 852 houve registro em Londres da ocorrência de doenças respiratórias atribuídas à queima de carvão para calefação.

A primeira lei contra a poluição do ar causada pela queima de combustíveis fósseis foi aprovada em 1273 em Londres. Que combustíveis fósseis eram usados naquela época?

Em 1661, John Evelyn advertiu para os efeitos nocivos causados pela queima de carvão.

Em 1769, James Watt adaptou a máquina a vapor movida a carvão para uso industrial, dando início à Revolução Industrial na Inglaterra.

O Barão Jean-Baptiste-Joseph Fourier foi o primeiro a fazer uma analogia entre a atmosfera da Terra e uma estufa, descrevendo pela primeira vez o efeito estufa, em 1827. O irlandês John Tyndal aprofundou a tese de Fourier, afirmando que o dióxido de carbono e o vapor d’água ajudavam a atmosfera a reter o calor.

Tyndal acreditava que a composição de gases da atmosfera poderia alterar a temperatura do planeta.

Em 1860, a concentração de dióxido de carbono na atmosfera era de 275 partes por milhão; em 1996, era de 360ppm. Naquele ano, a humanidade jogou 5,5 gigatoneladas de carbono na atmosfera.

Antes da era industrial, a atmosfera tinha 550 bilhões de toneladas de carbono na forma de dióxido de carbono; hoje, são mais de 750 bilhões de toneladas.

A tese de que o aumento da concentração de gás carbônico na atmosfera levaria ao aquecimento global foi proposta pela primeira vez em 1896 pelo químico sueco Svante Arrhenius, um dos pais da química moderna, formulador da teoria sobre ácidos e bases, e ganhador do Prêmio Nobel de Química em 1903.

Hoje se sabe que Vênus tem uma grande concentração de gás carbônico na atmosfera e muito calor. Em contraste, Marte é um planeta árido e gelado.

Em 1938, o meteorologista britânico G. D. Callendar tentou em vão convencer a Royal Geographical Society de que o aumento da temperatura registrado desde 1880 era resultado da maior concentração de gás carbônico.

Em 1957, como parte do Ano Geofísico Internacional, foi instalada no Havaí a primeira estação para medir a concentração de gás carbônico na atmosfera. Uma pesquisa acadêmica concluiu que os oceanos não estavam absorvendo gás carbônico como se acreditava.

No governo Lyndon Johnson (1963-69), a Casa Branca realizou em 1965 uma pesquisa sobre a queima de combustíveis fósseis e o aumento sustentado da concentração de gás carbônico na atmosfera. Em 1970, o Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, do inglês) fez um simpósio em Cambridge, nos EUA.

CIÊNCIA DA MUDANÇA DO CLIMA
O primeiro encontro internacional de cientistas para discutir a mudança do clima foi realizado em Wijk, na Suécia, em 1971.

Em 1972, a Suécia sediou, em Estocolmo, a Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano.

Em 1975, o Serviço Atmosférico Nacional (NAS) dos EUA destacou a necessidade de mais pesquisas sobre mudança do clima. Em 1977, pede “ação imediata”.

A 1ª Conferência Mundial sobre o Clima é realizada em Genebra, na Suíça, pela Organização Meteorológica Mundial, em 1979.

Em 1982, o NAS divulgou um relatório advertindo que a duplicação da concentração de dióxido de carbono na atmosfera para aumentar a temperatura média do planeta de 1,5ºC a 4,5ºC. Um consenso começava a se formar na comunidade científica.

Estimativas posteriores sugerem que o aquecimento global pode ser ainda mais grave, com um possível aumento de temperatura de oito a dez graus (LASHOF, 1989).

 A Conferência Internacional para Avaliar o Papel do Gás Carbônico e Outros Gases de Efeito Estufa nas Variações do Clima e Impactos Associados, realizada em Villach, na Áustria, concluiu em 1985 que há um processo de aquecimento global causado pelo homem.

O Relatório Brundtland, Nosso Futuro Comum, foi divulgado pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento  em 1987. Lança o conceito de desenvolvimento sustentável, aquele que não compromete o bem-estar das futuras gerações.

Em junho de 1988, a Conferência sobre a Mudança da Atmosfera: Implicações sobre a Segurança foi realizada em Toronto, no Canadá. Concluiu que a humanidade está “conduzindo uma experiência global sem controle e sem intenção cujas consequências finais seriam menos danosas apenas do que uma guerra nuclear”.

A Conferência de Toronto propôs uma redução até 2005 em 20% do nível de emissões de 1988.

Em novembro de 1988, o Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC , do inglês) fez sua primeira reunião, na sede da ONU em Genebra, na Suíça. Em 1990, o IPCC previu que haveria um aumento de um grau centígrado em relação àquele ano e de dois graus em relação à era pré-industrial até 2025 e de 3ºC em relação a hoje e de 4ºC em relação à era pré-industrial até o fim do século 21.

De qualquer forma, os ecossistemas serão submetidos a enormes pressões neste século. Além disso, o ritmo do aquecimento do planeta pode se acelerar, tornando-se até 50 vezes mais rápido do que num processo natural. E, em segundo lugar, com o agravamento do efeito estufa, os desastres meteorológicos – incêndios, secas, furacões e enchentes – podem se tornar mais frequentes e mais violentos

CONVENÇÃO DO CLIMA
Em dezembro de 1988, a Assembleia Geral da ONU pediu à Organização Meteorológica Mundial e ao Programa de Meio Ambiente da ONU para propor medidas para mitigar o aquecimento global e para uma convenção internacional sobre mudança do clima.

Ao fazer planos para congelar as emissões de gás carbônico nos níveis de 1989-90, a Holanda tornou-se o primeiro país a estabelecer metas para conter o aquecimento global.

A primeira reunião do comitê internacional de negociação sobre uma Convenção Quadro sobre Mudança do Clima foi realizada em Washington, nos EUA, em 1991, seguida de encontros em Genebra e Nairóbi. Em maio de 1992, os negociadores chegaram a um acordo em Nova York.

Apesar da oposição dos EUA e dos países exportadores de petróleo, a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio-92) aprovou a Convenção Quadro sobre Mudança do Clima, que entraria em vigor em março de 1994.

O presidente George Bush, pai, declarou que não faria nada capaz de reduzir a lucratividade e a produtividade das empresas americanas. Usou o mesmo discurso para rejeitar também a Convenção sobre Diversidade Biológica. Sinalizava assim a oposição dos EUA ao Protocolo de Quioto.

PROTOCOLO DE QUIOTO
O vice-presidente Al Gore, que veio à Rio-92 fazer sombra a Bush, se empenhou pessoalmente pela aprovação do protocolo em 1997 na antiga capital do Japão. O acordo de Quioto propunha uma redução em média de 5% nas emissões de gases de efeito estufa de 1990 e seu congelamento em 37 países desenvolvidos.

Como o aquecimento global é resultado da poluição industrial, os países industrializados há mais tempo têm maior responsabilidade. Os países em desenvolvimento não estavam submetidos a nenhuma obrigação.

Mas o maior poluidor do mundo naquela época, os EUA, nunca ratificou o Protocolo de Quioto. O presidente Bill Clinton assinou o acordo no último dia de seu governo, jogando a bomba no colo de George W. Bush.

Pela Constituição dos EUA, todos os acordos internacionais precisam ser aprovados pelo Senado. Nunca houve condições políticas para aceitar a imposição externa de um limite para a emissão de gases pelos americanos.

Gore ganhou um Oscar em 2007 pelo filme documentário Uma Verdade Inconveniente, mas não conseguiu se eleger presidente nem mobilizar os americanos para pressionar o Senado ou poluir menos.

De 1990 a 2010, as emissões dos EUA cresceram 13% e as da Europa, 1%.

Em 2007, o IPCC apresentou as seguintes conclusões:
• Há pelo menos três décadas, o aquecimento global atinge todas as regiões da Terra, com alta média de 0,5ºC a 1ºC no Equador e de até 4ºC nos polos. Nas latitudes médias, a elevação já é da ordem de 2ºC. Na Europa, as estações mais quentes estariam começando 15 dias mais cedo.
• Os ciclos de vida de inúmeras espécies e ecossistemas está sendo perturbado.
• Para limitar o aumento da temperatura em 2ºC até 2100, seria necessário reduzir as atuais emissões de gases de efeito estufa pela metade até 2050 e em um quarto até 2100.
• Estes modelos não consideram algumas incertezas capazes de agravar o aquecimento e acelerar a elevação do nível dos mares, como o derretimento total das calotas polares.

Desde a aprovação da Convenção Quadro sobre Mudança do Clima, na Rio-92, houve 17 conferências das partes, ou seja, dos signatários da convenção. A 18ª Conferência sobre Mudança do Clima será realizada de 26 de novembro a 7 de dezembro de 2012 em Doha, no Catar, uma das monarquias petroleiras que no princípio rejeitava a tese da mudança do clima sob ação do homem.

Seu objetivo será negociar um acordo para substituir o Protocolo de Quioto, que expira no fim deste ano. Diante do fracasso das negociações até aqui, uma das propostas é prorrogar o acordo atual, mas o Canadá, o Japão e a Rússia já anunciaram que não pretendem aceitá-la.

A maior esperança era a 15ª Conferência sobre Mudança do Clima, realizada em Copenhague, na Dinamarca, em dezembro de 2009, com a presença de chefes de Estado como os presidentes Barack Obama, Hu Jintao e Luiz Inacio da Silva, e os primeiros-ministros da Europa e do Japão.

Se Quioto fracassou pela ausência do maior poluidor, os EUA, na Conferência de Copenhague, Obama não tinha a menor condição de propor algo mais do que uma tímida redução em relação aos níveis de 2005 que mesmo assim não foi aceita pelo Senado.

Ao mesmo tempo, o mundo mudou. O maior poluidor hoje é a China, que está interessada em aumentar sua eficiência energética e controlar a poluição, mas não aceita a imposição de limites externos a seu desenvolvimento.

Os grandes países emergentes, especialmente a China, a Índia, o Brasil e a Indonésia, não querem aceitar imposições dos países ricos, que inicialmente poluíram sem limites e depois exportaram suas fábricas sujas para o Terceiro Mundo. E os países ricos não querem fazer concessões unilaterais, especialmente para a China, segunda maior economia do mundo.

Sem a China e os EUA, maiores poluidores mundiais, o máximo que os países-membros da ONU concordaram em Copenhague foi em continuar negociando. Sem os grandes emergentes, os EUA, o Canadá, o Japão e a Rússia, só a União Europeia parece interessada em reduzir as emissões de gases de efeito estufa.

Como a UE responde por apenas 11% das emissões, pode ser um bom exemplo, mas não vai resolver o problema sozinha.

Em meio a uma crise econômica, e esta é a pior desde a Grande Depressão (1929-39), todo mundo está preocupado com crescimento e emprego – e não com a proteção ao meio ambiente.

Por isso, não houve avanços significativos na Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20) nem há expectativa de progresso nos próximos anos nas negociações globais sobre mudança do clima. Mas muitos governos regionais e municipais, organizações não governamentais e cidadãos conscientes estão tomando medidas para reduzir a queima de combustíveis fósseis, inclusive nos EUA.

BIBLIOGRAFIA:
BARBAULT, Robert – Ecologia Geral. Petrópolis: Vozes, 2011.
BRENTON, Tony – The Greening of Machiavelli. Londres: Earthscan, 1994.
GRUBB, Michael and others – The Earth Summit Agreements. Londres: Easthscan, 1993.
ROWLANDS, Ian – The Politics of Global Atmospheric Change. Manchester: Manchester University, 1995.
TRIGUEIRO, André - Mundo Sustentável 2. S. Paulo: Globo, 2012.

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