segunda-feira, 20 de julho de 2009

Diário de Londres

LONDRES - Hoje, no Financial Times, os conservadores querem acabar com a Autoridade de Serviços Financeiros, criada pelo governo Tony Blair (1994-2006) para policiar o sistema financeiro, deixando ao Banco da Inglaterra a função principal de administrar a política monetária, perseguindo a meta de inflação estabelecida pelo governo.

The Independent, agora em formato tabloide e longe daquele jornal realmente independente criado nos anos 80, traz um furo: princesa saudita que teve um filho com um britânico recebeu secretamente asilo no Reino Unido. Sem qualquer confirmação oficial saudita ou britânica, parece coisa de tabloide.

Nos tabloides propriamente ditos, os chamados jornais populares, alguns distribuídos agressivamente na boca do metrô, destaque para a reação negativa da torcida do Los Angeles Galaxy, que vaiou e quis bater em David Beckham em sua volta para os Estados Unidos. A torcida do time americano está convencida de que Beckham queria mesmo ficar no Milan.

Pela manhã, dei minha corrida no Bosque de Highgate (Highwood Wood). A corrida começou no Bosque das Cerejeiras (Cherry Tree Wood), em East Finchley, onde morei oito anos e agora estou hospedado, na casa de um amigo. Highgate Wood é uma floresta de carvalhos de 7 mil anos.

A última glaciação terminou há 12 mil anos. Naquela época, a Inglaterra estava coberta de gelo. A camada de gelo recuou. Há 7 mil anos, o país voltava a ser uma ilha e nascia o Bosque de Highgate.

Não muito longe dali, no Cemitério de Highgate, está a prova de que Karl Marx está morto e enterrado no seio da sociedade liberal. Fui visitar o túmulo num dia frio e cinzento do verão londrino, onde ele está enterrado sob uma escultura monumental de sua cabeça e a frase: "Trabalhadores de todo o mundo, uni-vos!"

Pelo chão, há vários cartões de visita deixados por marxistas de todos os matizes, sindicalistas, socialistas, comunistas.Em 28 Dean St., o fundador do comunismo viveu alguns anos numa casa apertada onde teria começado a escrever O Capital.

À tarde, fui comprar uma mala extra para meus novos livros e sapatos. É fim do ano letivo na Europa. Os estudantes estrangeiros estão voltando para casa. As livrarias de livros usados das universidades tem barbadas fantásticas, acadêmicas e de ficção. Precisei comprar uma mala.

Na classe econômica, a BA dá direito a duas malas de 23 kg cada - e cobra 25 libras de excesso acima de 25kg. Fui numa loja japonesa de design cool, a Muji.

À noite, vi um show espetacular de Marianne Faithful no Royal Festival Hall. Definitivamente, a ex de Mick Jagger nos anos 60 que virou junkie e chegou a morar nas ruas de Londres, é agora uma grande dama cult, adorada pela plateia londrina, que a aplaudiu de pé demoradamente, como também acontece em Paris.

Foi emocionante ouvi-la cantar As Tears Go By, "onde tudo começou", Sister Morphine e Solitude, de Duke Ellington, que ela revelou ter ouvido com Billie Holliday.

Saí flechado para jantar no restaurante Le Gavroche, um dos mais mais de Londres. Estava muito bom, mas não espetacular como em L'Atelier de Joël Robuchon, realmente uma experiência gastronômica, onde fui na quinta-feira passada.

A carta de vinhos do Gavroche era poderosa, com uma página para a cave Romanée Conti, a partir de 395 libras a garrafa. O vinho mais caro era um Chateau Lafite de Rothschild 1945. Custava mais de 10 mil libras. Bem... um vinho de 1945 deve ser uma preciosidade, não?

Amanhã, terça, vou ver Kyle Eastwood, filho do Clint, tocar baixo no Ronnie Scott's, meu bar de jazz favorito.

Na quarta, foi experimentar a cozinha do chef Alain Ducasse no Dorchester, um dos hotéis mais tradicionais, onde participei de várias entrevistas com artistas, inclusive a coletiva do Spielberg no lançamento de Salvando o Soldado Rian na Europa, na qual só os ingleses puderam perguntar.

Lá, provoquei Quentin Tarantino, dizendo que Jackie Brown, talvez o pior de seus filmes, não era um filme tarantinesco: "Só fiz dois filmes [Cães de Aluguel e Pulp Fiction] e já querem definir um estilo para mim. Quero ser livre como o Martin Scorcese, que pode fazer qualquer tipo de filme." Ele não é Martin Scorcese.

Outra grande experiência foi ver Hamlet com Jude Law, na minha opinião, muito melhor do que a versão de Aderbal Freire com Wagner Moura, um Hamlet afetado, esganiçado e com um desnecessário sotaque baiano.

Mas, para o jornalista conservador Matthew d'Ancona, o ser ou não ser de Jude Law não convence. Como na visão de D'Ancona o ator se acha o máximo, seu dilema existencial seria "ser espetacular ou ser ainda mais espetacular".

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