quinta-feira, 29 de maio de 2008

Tribunal argentino considera ter droga um direito

Em uma decisão que contraria sentença anterior do próprio tribunal, os desembargadores da 1ª Câmara do Tribunal de Justiça da Província de Buenos Aires consideraram inconstitucional deter e acusar uma pessoa pela posse de drogas para uso pessoal. Eles absolveram um jovem preso com menos de meio grama de maconha, afirmando que cada pessoa é "o único juiz de suas questões pessoais".

A posse de droga para uso pessoal, argumenta o desembargador-relator, Benjamín Ramón Sal Llargués, "longe de ser uma conduta proibida, é uma conduta que consagra o exercício da liberdade".

É o contrário do que decidiu a 2ª Câmara do mesmo tribunal de apelações de La Plata. Em 27 de dezembro de 2007, considerou a posse de drogas para consumo pessoal um delito.

"Criminalizar o mal que alguém produz a si mesmo, como no caso do consumo de drogas, significa a assunção pelo Estado de um critério paternalista autoritário alheio ao princípio de autonomia da pessoa que nos remete às piores épocas de nossa história recente", sentenciou o juiz.

Na prática, o parecer de Sal Llargués, acompanhado por seu colega Carlos Natiello, considera inconstitucional o parágrafo II do Art. 14 da Lei de Estupefacientes (23.737), que fixa as penas de reclusão para quem é preso com drogas ilegais em seu poder: "A pena será de um mês a dois anos de prisão quando, pela escassa quantidade e demais circunstâncias, ficar inequivocamente evidenciado que a posse era para uso pessoal".

Para os juízes liberais, essa norma jurídica contradiz o Art. 19 da Constituição da Argentina, que diz: "as ações privadas que de nenhum modo ofendam a ordem e a moral pública, nem prejudiquem a um terceiro, estão reservardas a Deus e isentas da autoridade dos magistrados".

Como parte da criminalização da posse de drogas para consumo pessoal, "há um núcleo subjacente de idéias que leva a práticas de prevenção de caráter despótico, contrárias à liberdade pessoal e à dignidade humana", argumenta Sal Llargués.

"Ao penalizar o simples portador para consumo personal, o Estado adiciona o crime ao problema da droga, e o joga no sistema penal, criando um antecedente que muito provavelmente o marcará e o prejudicará no futuro, provocando eventualmente sua estigmatização".

O presidente do tribunal, Federico Domínguez, vai levar a questão a uma sessão plenária para que todos os desembargadores da província de Buenos Aires decidam se a posse de drogas é ou não um delito criminal.

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