sexta-feira, 5 de janeiro de 2007

Emergentes sustentam crescimento em 2007

Se as economias mais ricas – Estados Unidos, Europa e Japão – tendem a manter baixas taxas de crescimento em 2007, em torno de 2% ou pouco acima disso, os países emergentes, com crescimento médio de 7% ou mais, como neste ano, devem sustentar a expansão da economia mundial, que foi de cerca de 5% em 2006. Portanto, 2007 será mais um ano em que a globalização criará grandes oportunidades.

Com sua economia de US$ 13,3 trilhões anuais, os EUA surpreendem, apesar das previsões catastrofistas. O déficit comercial deve bater recorde em 2006. Mas não haverá colapso da moeda americana enquanto a China, que terminou o ano com US$ 1 trilhão de reservas, continuar comprando dólares.

“A queda do dólar deve aliviar um pouco o déficit comercial, os juros estão estabilizados, talvez entrem num ciclo de queda, e os preços do petróleo estão mais estáveis”, observa o economista e doutor em relações internacionais Paulo Wrobel, assessor de ciência e tecnologia da Embaixada Brasileira no Reino Unido.

“A economia européia está razoavelmente bem, apesar do fortalecimento do euro. Passou a fase mais recessiva”, comenta Wrobel.

O Japão, que parecia ter vencido a estagdeflação dos anos 90, voltou a patinar. No terceiro trimestre, a taxa de crescimento anual foi de 0,8% devido às exportações, com consumo doméstico fraco.

Pelo segundo ano seguido serão os países emergentes, sobretudo a China e a Índia, com taxas de crescimento em torno de 10%, e também a Rússia, com seus vastos recursos energéticos, que manterão a economia mundial numa expansão em torno de 5%. Com o aumento da demanda provocado pelo extraordinário crescimento asiático, é improvável que o preço do petróleo, que chegou a US$ 78 em agosto de 2006, caia para US$ 50.

Há uma mudança no equilíbrio de poder na economia internacional, nota The World in 2007 (O Mundo em 2007), a edição especial da revista inglesa The Economist com previsões para o ano que começa.

O poder está se deslocando com a crescente importância da Ásia, uma região muito menos institucionalizada que a Europa, sem acordos de segurança coletiva, onde a proliferação nuclear coloca novos riscos. Por enquanto, o crescimento econômico parece a cura para todos os males.

A revolução econômica provocada pela globalização vai muito mais longe. Com a liberalização comercial, o avanço tecnológico, o desenvolvimento dos mercados de capitais e as mudanças demográficas, a atividade econômica passa por um enorme rearranjo, observa a consultora McKinsey em suas Tendências Macroeconômicas.

Hoje a Ásia, excluindo o Japão, é responsável por 13% do produto mundial bruto, enquanto a Europa tem mais de 30%. Em 20 anos, estes dois continentes devem convergir. A China fará 20% da produção manufatureira até 2020 ou 2030.

No setor de serviços de informática, a mudança será igualmente dramática. O grande destaque deve ser a Índia. Como líder das revoluções tecnológicas de informática e biotecnologia, os EUA provavelmente continuarão tendo a maior economia do mundo.

Quanto ao Brasil, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva prometeu anunciar um conjunto de medidas para acelerar o crescimento, que no primeiro governo ficou na média fraca de 2,7% ao ano, pouco acima de Fernando Henrique Cardoso, que enfrentou diversas turbulências na economia internacional.

MAIS UM BILHÃO DE CONSUMIDORES
Com o crescimento dos emergentes, um bilhão de novos consumidores entrarão no mercado global na próxima década. Até 2015, o poder de compra dos países emergentes deve mais do que dobrar, de US$ 4 trilhões para US$ 9 trilhões.

Também haverá mudanças dentro dos países. Em 2015, a população hispânica dos EUA terá o poder de compra de 60% da China.

A contrapartida do crescimento dos emergentes é um aumento do protecionismo nos países ricos, ou pelo menos uma redução do ímpeto liberalizante, como se vê na estagnação das negociações da Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio.

Em julho, vence a Autoridade de Promoção Comercial dada pelo Congresso ao presidente Bush. É improvável um acordo até lá. A rodada deve se estender por mais alguns anos, empurrada pela dinâmica do comércio internacional, que cresce 9% ao ano.

No meio desta revolução tecnológica, surgem novos modelos de negócios. Diversos setores, nota a McKinsey, apresentam uma estrutura com poucos gigantes no topo, poucas empresas médias e uma grande variedade de pequenas e microempresas extremamente ágeis na base.

Há também uma aproximação de produtores, fornecedores e distribuidores que cria um novo “ecossistema” de negócios.

A participação cada vez maior de pequenos investidores nos mercados financeiros aumenta a oferta de capital, muda os padrões de propriedade das empresas e seus ciclos de vida.

As bolsas de valores tiveram seu melhor resultado desde 2003. O Financial Times prevê queda em 2007 mas ressalva que as taxas de crescimento e as operações de fusão e incorporação podem esquentar o mercado.

Neste ambiente ultracompetitivo, a gestão passou de arte à ciência. Não pode prescindir dos métodos mais modernos de administração – e isto vale tanto para o setor público quanto para o privado.

Outra constatação importante da McKinsey é um crescimento da demanda por ações efetivas do setor público em saúde, educação e previdência social que exige um aumento de produtividade. Nos EUA, por exemplo, o economista Paul Krugman, um dos maiores críticos do presidente George Walker Bush, acredita que chegou a hora de oferecer cobertura de saúde universal à população americana.

O acesso cada vez maior à informação está moldando a chamada economia do conhecimento. Sites de busca na Internet como o Google oferecem quantidades praticamente infinitas de informações. Mas a transformação é muito mais profunda. Estão surgindo novos modelos de produção, acesso, difusão e propriedade do conhecimento.

A cada ano desde 1990, o número de patentes registradas aumenta 20%.

O risco, tanto para empresas quanto indivíduos, é como se orientar nesta selva da informação.

FALTA DE LIDERANÇA
“Do ponto de vista político, o quadro é meio dramático. Há uma ausência de liderança política”, lamenta o professor Wrobel. “O momento unipolar americano está chegando ao fim. Bush é um problema. É ruim sob todos os ângulos.”

Os democratas estão assumindo o controle do Senado e da Câmara. A derrota republicana em novembro deu a largada para a eleição presidencial de 2008. O senador de origem queniana Barack Obama, considerado a mais carismática opção de centro-esquerda desde Bob Kennedy, em 1968, vai desafiar Hillary Clinton pela candidatura democrata? É uma das questões do ano em Washington.

Com o fracasso da invasão do Iraque pelos EUA e da estratégia militarista de Bush, o jornal inglês Financial Times aposta que os americanos não atacarão o Irã mas não considera um ataque totalmente impossível. Já o jornal espanhol El País acredita que haverá maior espaço para a diplomacia e o poder suave da União Européia. Mas o bloco se debate com seus problemas internos.

A UE completa 50 anos em março. Está em sua crise de meia idade. Acaba de aceitar a Bulgária e a Romênia como novos sócios, mas vai parar a expansão até rediscutir o projeto de Constituição da Europa derrubado em 2005 por um plebiscito na França.

A chanceler (primeira-ministra) Angela Merkel, da Alemanha, que acaba de assumir a presidência rotativa da UE por seis meses, promete “injetar vida nova no processo constitucional”.

No Reino Unido, o primeiro-ministro Tony Blair deve passar o cargo e a liderança do Partido Trabalhista para o ministro das Finanças, Gordon Brown.

Na França, serão realizadas eleições presidenciais. Os favoritos são a socialista Ségolène Royal pela esquerda e o ministro do Interior, Nicolas Sarkozy, à direita. Nas pesquisas, estão praticamente empatados e certamente haverá segundo turno.

O Financial Times aposta em Sarkozy como “um político intuitivo, debatedor formidável e feroz em campanhas eleitorais. Mas Ségolène não deve ser desprezada. Pode ser a primeira mulher a presidir a França.

GUERRA CIVIL MUÇULMANA
No Oriente Médio, a situação é trágica, opina Wrobel: “O Iraque está muito mal. O crescimento regional do Irã é complicado. Não há nada de novo na Palestina. É um cenário muito pessimista”.

Há uma guerra civil no mundo árabe e muçulmano em torno da verdadeira interpretação do Corão e dos desafios da modernidade. Os atentados de 11 de setembro de 2001 e subseqüentes apenas levam esta guerra para as grandes potências que os fundamentalistas responsabilizam pelo seu atraso e subdesenvolvimento.

A ela se soma um conflito crescente entre xiitas e sunitas deflagrado pela disputa de poder no novo Iraque depois da invasão americana. Os sons e imagens do ex-ditador Saddam Hussein sendo insultado por carrascos xiitas antes de ser enforcado em 30 de dezembro só alimentam a guerra civil iraquiana, que ameaça envolver o Irã e a Arábia Saudita numa megaconflagração de conseqüências imprevisíveis.

Com o acordo nuclear entre os EUA e a Índia, o regime de não-proliferação sofre mais um abalo. “A Índia nunca aceitou o regime e foi beneficiada”, constata o assessor de ciência e tecnologia. “Os EUA reconheceram o status nuclear da Índia. Com o Irã e a Coréia do Norte buscando ativamente fabricar a bomba atômica, pode ser um tiro fatal no Tratado de Não-Poliferação Nuclear (TNP)”.

A Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) se gaba de ter vencido a União Soviética sem dar um tiro. Sobreviverá ao Afeganistão? Enfrenta uma guerrilha fundamentalista que já esteve no poder, os Talebã, financiados pelo tráfico de heroína e com apoio em áreas tribais junto à fronteira do Paquistão, além da ajuda de setores das Forças Armadas paquistanesas.

A Rússia continuará usando e abusando do nacionalismo energético para submeter as antigas repúblicas da URSS, o “império interior” soviético. Mas não deve atacar a Geórgia. Em 2008, haverá eleição presidencial. Então 2007 será o ano para Putin preparar seu candidato.

A China manterá sua ofensiva para ter acesso aos recursos naturais necessários para manter seu extraordinário ritmo de desenvolvimento. É uma superpotência econômica. Em certa medida, reconhece o FT, a África já é uma província chinesa.

Na América Latina, Paulo Wrobel vê as eleições do ano passado como mais uma etapa da consolidação democrática: “Talvez a maior surpresa tenha sido Rafael Correa, no Equador. Em termos de política econômica, mesmo o Morales não tem muito fazer: é equilíbrio fiscal e abertura comercial”.

Wrobel entende que o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, apenas repete políticas de expansão dos gastos públicos que se mostraram irresponsáveis nos últimos 30 anos e vê problemas na inserção internacional do bloco: “Quanto mais países, mais difíceis a união aduaneira e o mercado”.

Em Cuba, com câncer ou sem câncer, é improvável que Fidel Castro volte a assumir os plenos poderes que tinha desde 1º de janeiro de 1959, raciocina Wrobel: “O presidente interino Raúl Castro e [o secretário executivo do Conselho de Ministros] Carlos Lage vão segurar o sistema? Não será fácil manter o castrismo sem Fidel. Não será fácil uma transição para um regime de livre mercado. Talvez o melhor cenário seja uma abertura gradual”.

Na Argentina, o presidente Néstor Kirchner deve se candidatar à reeleição como favorito, embora venha acenando com a possibilidade de lançar sua mulher, a senadora Cristina Fernández de Kirchner, que poderá concorrer ao governo da província de Buenos Aires. Isto tornaria esta versão moderna de Perón e Evita num dos casais mais poderosos da História da Argentina.

Mas o maior desafio para a política externa brasileira será integrar a Venezuela de Chávez sem alterar o objetivo original do Mercosul de ser um instrumento político de reinserção econômica internacional dos países do Cone Sul.

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