sábado, 16 de setembro de 2006

Bento XVI não teve sensibilidade política

PARIS - Os muçulmanos estão em polvorosa porque o papa Bento XVI descreveu o islamismo como "uma religião da espada", guerreira. Na verdade, ele falou como intelectual e acadêmico, propondo um diálogo. E tem razão: o islamismo nasceu como um religião da espada. Dominou primeiro a Arábia e depois se expandiu pelo Norte da África, chegando até a Península Ibérica.

Mas quantas guerras foram travadas em nome da fé cristã?

No momento em que fanáticos muçulmanos pregam o conflito de civilizações, tentando ressuscitar as cruzadas, as palavras do papa revelam, no mínimo, falta de sensibilidade política.

Imediatamente, Bento XVI foi acusado de ser aliado dos Estados Unidos e de caracterizar os muçulmanos como terroristas. Na prática, estimulou o radicalismo que pretendia combater.

É mais um sinal do desentendimento entre as culturas. Enquanto no Ocidente a razão pretende ser a mediadora de todos os debates, o Islã não passou pela revolução das idéias liberais do iluminismo e os fundamentalistas não admitem qualquer contestação a seus dogmas. Afinal, o Corão teria sido ditado diretamente por Deus ao profeta Maomé.

Só que a intolerância e o fundamentalismo religioso não são exclusividade dos muçulmanos. Jesus Cristo ensinou os homens a amarem uns aos outros. Mas em 1095, no seu famoso sermão em Clermont-Ferrand, aqui onde hoje é a França, o papa Urbano II mandou matar os infiéis, lançando as cruzadas, nove guerras santas em que os cristãos tentaram tomar Jerusalém.

Novecentos anos depois, Ossama ben Laden e seus asseclas usam a mesma lógica.

Como observou o embaixador Alberto Costa e Silva, num seminário realizado recentemente pelo Itamaraty, "toda religião é fundamentalista".

Ao ver a escultura a Porta do Inferno, que Auguste Rodin fez a partir da Divina Comédia, de Dante Alighieri, a obra-prima da literatura italiana, é difícil discordar do embaixador. A diferença fundamental é que no Ocidente laico e secularista a maioria das pessoas não acredita mais no inferno; os muçulmanos radicais acreditam.

Se um Exército de Deus deve combater os infiéis, é óbvio que deve matá-los para que eles se encontrem logo com o Senhor e tenham a punição merecida.

O diálogo entre as civilizações na busca da paz ficou mais difícil.

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